Lei afasta vínculo de emprego do autônomo *

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Lei afasta vínculo de emprego do autônomo *

São Paulo, 29.1.07 – A Lei nº 11.442, de 05.01.2007, veio colocar um ponto final em grande celeuma, até então existente, acerca do reconhecimento de vínculo de emprego do transportador rodoviário autônomo que por razões de interesse comercial presta serviço de transporte com exclusividade a uma transportadora.
No seu artigo 4º, a Lei nº 11.442/2007 cria a figura do transportador autônomo independente e do transportador autônomo agregado, atento o legislador para a realidade das relações do setor de transporte rodoviário de cargas, que a longos anos adota prática que diferencia o agregado do independente. Assim, a lei define como transportador autônomo agregado ?aquele que coloca veículo de sua propriedade ou de sua posse, a ser dirigido por ele próprio ou por preposto seu, a serviço do contratante, com exclusividade, mediante remuneração certa? e independente ?aquele que presta os serviços de transporte de carga de que trata esta Lei em caráter eventual e sem exclusividade, mediante frete ajustado a cada viagem?
No seu artigo 5º a mesma lei dispõe expressamente que o contrato celebrado pelo transportador autônomo, seja o agregado ou seja o independente, ?são sempre de natureza comercial? e não enseja, ?em nenhuma hipótese, a caracterização de vínculo de emprego?.
O comando legal é claro: seja na hipótese de contratação de transportador autônomo independente, que é aquela contratação eventual, esporádica, sem exclusividade que já não havia qualquer dúvida sobre a inexistência de vínculo de emprego; ou seja na hipótese de contratação de transportador autônomo, definido como agregado ? aquele que coloca seu veículo a serviço exclusivo do contratante, dirigido por ele mesmo ou por preposto ? não haverá relação de emprego, mas sim uma relação comercial regida pelo contrato que for celebrado entre as partes.
O contrato de transporte é um contrato típico, de natureza comercial, definido no Código Civil, como sendo aquele pelo qual alguém se obriga a transportar pessoas ou coisas, de um lugar para outro, mediante remuneração (artigo 730). Não se trata de uma simples prestação de serviços, posto que o contrato pressupõe tenha o transportador os meios necessários para efetuar o transporte e que esse meio de transporte seja colocado à disposição para o efetivo cumprimento do contrato. No caso do transportador autônomo de carga a lei exige que ele tenha um veículo que será utilizado para o transporte, seja ou não ele quem o dirige, pelo que temos que o contrato de transporte assume também caracteres de uma verdadeira locação do instrumento de transporte que é o veículo de propriedade do transportador, ou por ele arrendado.
O caráter de locação do veículo no contrato de transporte sobressai ainda mais da lei nº 11.442/2007, quando no seu artigo 2º, § 1º, inciso I, exige do TCA ? Transportador Autônomo de Cargas ? agregado ou independente ? a comprovação de ser proprietário, co-proprietátio ou arrendatário de veículo automotor de carga registrado no órgão de trânsito como veículo de aluguel. Ora, a lei exige que o veículo seja de aluguel pela razão única de ser o contrato de transporte um contrato que encerra uma locação ou o aluguel do veículo. Assim, pode-se dizer que no contrato com o transportador autônomo agregado, no transporte rodoviário de cargas, existe um contrato que se assemelha ou se aproxima ao contrato de fretamento, o qual segundo Maria Helena Diniz, é ?aquele em que o um contratante (fretador) se compromete, para com outro (afretador), mediante pagamento de frete, a realizar uma ou mais viagens preestabelecidas ou durante determinado período de tempo, reservando-se o controle sobre a tripulação e condução técnica do veículo de transporte.? (Tratado Teórico e Prático dos Contratos, Ed. Saraiva, 4º vol., pg. 390).
A remuneração do transportador autônomo não se restringe ao pagamento pelo serviço prestado, não se confundindo com o salário de empregado e nem mesmo com a remuneração da simples prestação de serviços. A toda evidência o frete que é a remuneração do transportador autônomo, no dizer da lei ora comentada, caracteriza-se como forma de remuneração bem mais abrangente, remunerando o combustível gasto no deslocamento do veículo, o desgaste e outras despesas de manutenção do mesmo, a remuneração do capital empregado, ou seja remuneração pela locação do veículo, e por último, a remuneração da prestação do serviço.
Tanto é verdade que o frete pago ao transportador autônomo não é simples remuneração de serviço que a legislação tributária (do Imposto de Renda) e previdenciária, cuidam em separar as parcelas do frete que devam ser entendidas como reembolso pela locação do veículo e despesas com o transporte, daquela que deva ser entendida como remuneração do serviço. Basta ver que sendo o contribuinte individual motorista autônomo a remuneração a ser considerada para efeitos da incidência das alíquotas de contribuição ao INSS há de ser a equivalente a 20% (vinte por cento) do rendimento bruto ou do frete (art. 201, § 4º, do Decreto 3048/99). Logo 80% do frete é considerado como remuneração pela locação do equipamento e 20% como remuneração do serviço. Já na legislação do imposto de renda, encontra-se a previsão de ser rendimento do trabalho quarenta por cento do rendimento bruto, decorrente do transporte de carga (art. 629, do Decreto nº 3000/99). Aqui 60% do frete é considerado remuneração pela locação do equipamento e 40% como remuneração pelo serviço ou do trabalho.
Não se pode confundir a opção daquele que contrata como transportador autônomo e recebe frete, no qual está compreendida remuneração muito superior a que seria a remuneração do trabalho ou do serviço, com a situação de indivíduo que apenas coloca à disposição da empresa a sua força de trabalho cuja remuneração, pela lógica, não pode abranger os encargos da locação de veículo de transporte. Sabidamente os encargos trabalhistas são elevadíssimos e por lei incidem sobre o salário e outras formas de remuneração da força de trabalho. A incorporação como se salário fosse de outros encargos abrangidos pelo frete levaria, fatalmente, a um enriquecimento indevido, não só do prestador de serviço que havia livremente contratado uma outra condição, mas também da previdência e da receita por auferirem contribuição e imposto sobre valores que a legislação própria expressamente exclui da incidência de uma e de outra exação.
Em hora oportuna a Lei 11.442/2007 vem colocar um ponto final nessa questão definindo o contato de transporte celebrado pelo transportador autônomo como sendo tipicamente contrato comercial, que em nenhuma hipótese caracteriza vínculo de emprego.
A fim de espancar qualquer dúvida sobre a natureza do contrato em questão, a lei nova estabelece que a competência para dirimir judicialmente as pendências advindas do contrato de transporte celebrado pelo transportador autônomo é da Justiça Comum, excluindo a competência da Justiça Especializada ou Trabalhista. A competência da Justiça do Trabalho, fixada na Constituição Federal, em seu artigo 114, diz-se ser sobre as questões oriundas das relações de trabalho.

O contrato de transporte como se viu não pode ser tido como um contrato que regula relações de trabalho, mas sim um contrato complexo que regula relações diversas. Trata-se de um contrato complexo que compreende uma relação de locação de um instrumento ou meio de transporte e ao mesmo tempo uma relação de prestação de serviço e por isso o legislador preferiu estabelecer a competência para dirimir as questões dele oriundas afeta à Justiça Comum.

É importante destacar que somente se pode afirmar a existência de contrato com o transportador autônomo que se enquadra nos ditames da Lei 11.442/2007, quando sua celebração se dá com a observância de todas as regras legais, previstas na própria lei e outras leis que possam ter aplicação, quer para a perfeita caracterização do transportador autônomo, quer para que fique clara a intenção de celebração de contrato de natureza comercial para o transporte de bens ou mercadorias.
Necessário destacar que o transportador autônomo de cargas é a pessoa física que seja proprietário, co-proprietário ou arrendatário de um veículo de aluguel, devidamente registrado em seu nome no órgão de trânsito; esteja devidamente registrado na categoria TAC ? Transportador Autônomo de Cargas, no RNTRC ? Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Carga junto à ANTT ? Agência Nacional de Transportes Terrestres (art. 2º, I, da Lei nº 11.442/2007); esteja devidamente inscrito como contribuinte individual, na qualidade de autônomo, junto ao INSS ? Instituto Nacional do Seguro Social, na forma do regulamento da previdência social(Art. 9º , inciso V e § 15, inciso I, do Dec. 3048/99).
Para a perfeita caracterização do contrato comercial de transportador autônomo, faz-se necessário, ainda, que o contratante daquele transportador em cumprimento da legislação aplicável, especialmente do regulamento da previdência social, ao efetuar os pagamentos do frete, cumpra a determinação legal de retenção da contribuição devida e o seu recolhimento. Tratando-se de contribuinte individual motorista autônomo a remuneração a ser considerada para efeitos da incidência das alíquotas de contribuição ao INSS há de ser a equivalente a 20% (vinte por cento) do rendimento bruto ou do frete (art. 201, § 4º, do Decreto 3048/99).
Se o transportador autônomo e contribuinte individual prestar serviços a mais de uma empresa a alíquota de sua contribuição será reduzida para 11% (onze por cento) conforme o disposto no artigo 30 § 4º, da Lei nº 8.212/91, devendo a retenção pela empresa tomadora dos seus serviços ater-se à alíquota reduzida e ainda observar o limite máximo do salário de contribuição (art. 13, § 1º, da IN87/2003).

Assim, a empresa tomadora dos serviços deverá reter 20% (vinte por cento) sobre 20% (vinte por cento) do valor do rendimento bruto pago, no caso de ser a prestação de serviço para uma só empresa no mês, ou então 11% (onze por cento) sobre 20% (vinte por cento) do valor do rendimento bruto pago, no caso de ser o contribuinte individual prestador de serviços para mais de uma empresa no mesmo mês, observando-se sempre o limite máximo do salário de contribuição.

Vale um alerta, deixando a empresa contratante de observar as normas legais de contratação de transportador autônomo de cargas, independente ou agregado, como acima enunciado, levará fatalmente ao entendimento de se tratar da contratação de motorista com vínculo de emprego, posto que não existe na legislação em vigor senão essas duas formas de contratação. A lei do disciplinamento da atividade de transporte abriga apenas e tão somente aqueles que a cumprirem.

*Marcos Aurélio Ribeiro é a assessor jurídico da NTC&LOgística

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