STF julga inconstitucional o uso dos recursos da Cide

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STF julga inconstitucional o uso dos recursos da Cide

Brasília, 19.12.03 – O Supremo Tribunal Federal (STF) deu provimento em parte, hoje (19/12), à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2925) ajuizada pela Confederação Nacional do s Transporte s (CNT) contra dispositivos da Lei Orçamentária de 2003 (Lei 10.640/03) . Os dispositivos autorizam o Executivo a fixar teto de 10% para abrir créditos suplementares, utilizando recursos provenientes da arrecadação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente sobre as operações realizadas com combustíveis.

A decisão foi aprovada por maioria plenária, acompanhando o voto do ministro Carlos Ayres Britto. Por ela, a Corte deu interpretação conforme a Constituição ao artigo 4º, inciso I, alíneas “a”, “b”, “c” e “d” da Lei 10640/03. O Supremo estabeleceu a única interpretação que pode ser dada ao artigo 177, parágrafo 4º, inciso II, da Constituição de 1988. Foram votos vencidos a relatora, ministra Ellen Gracie, e os ministros Joaquim Barbosa, Nelson Jobim e Sepúlveda Pertence. O ministro Carlos Ayres Britto foi seguido pelos ministros Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Carlos Velloso e pelo ministro presidente Maurício Corrêa.

A interpretação conforme a Constituição é uma técnica de decisão utilizada nas hipóteses em que a norma legal impugnada possui vários sentidos possíveis, alguns constitucionais e outros não. A técnica da “interpretação conforme” permite que o Tribunal exclua apenas os sentidos considerados inconstitucionais, preservando-se, assim, a parte constitucional da lei.

O dispositivo constitucional diz que a Cide é uma contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível. Os recursos arrecadados pela Cide serão destinados ao pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo; ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; e ao financiamento de programas de infra-estrutura de transportes.

De acordo com a interpretação dada pela maioria dos integrantes do STF , com base na Constituição, o Executivo pode abrir créditos suplementares com recursos da Cide desde que tenham como destinação exclusiva as três previsões constitucionais do artigo 177.

Segundo sustentou a defesa da CNT, o teto de suplementação previsto pela Lei não pode ser aplicado às dotações relacionadas com a fonte Cide-Combustíveis, por incompatibilidade com o artigo 177, parágrafo 4º, inciso II, da Constituição Federal (CF) , que preserva parte da receita da Cide para destinação específica.

A relatora da ação, ministra Ellen Gracie, indeferiu o pedido da ADI. Ao votar, disse entender que se as dotações de excesso de contingência e de excesso de arrecadação decorrentes da Cide-Combustíveis forem exauridas dentro de suas finalidades , não haveria ofensa ao artigo 177, parágrafo 4º, inciso II, da CF/88. Citou o entendimento da Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, em nota técnica nº 7, de 25/07/2003.

“O contingenciamento realizado não traduz efetivamente a ocorrência do desvio de finalidade na aplicação dos recursos da contribuição em debate. Busca a requerente (CNT) um provimento preventivo ou cautelar para afastar inconstitucionalidade ou ilegalidade, hipoteticamente considerada, que somente virá a ocorrer se os recursos da Cide combustíveis forem, de fato, utilizados nas movimentações intra-orçamentárias”, disse Gracie. A ministra foi acompanhada pelos ministros Joaquim Barbosa, Nelson Jobim e Sepúlveda Pertence.

O ministro Carlos Ayres Britto abriu a divergência ao afirmar que, no caso, todo o produto de arrecadação da Cide está vinculada a três finalidades (artigo 177, parágrafo 4º, inciso II).O ministro Marco Aurélio acompanhou a dissidência, julgando procedente a ADI ajuizada pela CNT. Considerou que o texto do dispositivo contestado (artigo 4º, inciso I, alínea “a”, Lei 10.640/03) permite interpretação abrangente, tanto que houve o ajuizamento.

“A União e a Confederação pensam de uma única forma: que não pode haver desvio de valores arrecadados a partir do que se contém no parágrafo 4º do 177. A dúvida está no alcance dessa Lei. Para um segmento considerável tem-se que ela viabiliza a utilização, como crédito suplementar, do que arrecadado a tal título e para outro segmento, não. Acredita-se que teremos uma fidelidade maior no campo da execução dessa própria Lei”, disse o ministro Marco Aurélio.

O ministro Carlos Velloso também acompanhou o ministro Carlos Ayres Britto. “Penso que a previsão de suplementação de créditos contida nos dispositivos impugnados da Lei Orçamentária Anual não pode atingir a destinação da Cide, instituída pela Lei 10.336 de 2001. É dizer, a destinação a ser observada é a do artigo 177, parágrafo 4º, inciso 2. Vale dizer, as três finalidades ali indicadas. Não estou dizendo que o governo deve gastar. Isso é um ato político. Não pode é desvincular o produto da arrecadação daquilo que está expressamente posto na Constituição”, votou.

O ministro Sepúlveda Pertence acompanhou a relatora. “Confesso, senhor Presidente, que não vejo nas alíneas do artigo 4º da Lei Orçamentária esta ambigüidade capaz de autorizar a interpretação conforme. A interpretação está feita e a fez a eminente relatora, mas não é dispositivo de uma declaração de inconstitucionalidade a que se tem dado nome de interpretação conforme. Trata-se de norma geral, por isso mesmo conhecemos da Ação Direta. Nada tem de específico com essa contribuição, dirige-se tanto a receitas desvinculadas quanto a receitas vinculadas, conforme a Constituição. E nela não vejo possibilidade de interpretação que leve à autorização de um desvio das destinações predeterminadas às receitas vinculadas, como são as receitas das contribuições”.

Ao votar pela procedência da Ação, o presidente do Supremo, ministro Maurício Corrêa, também entendeu que a Lei Orçamentária dá margem a interpretações diferentes sobre o texto da Constituição. “Examinando o ato impugnado , verifica-se uma disposição que a meu juízo afronta inegavelmente o artigo 177, parágrafo 4º, iniciso II da Constituição Federal, até porque quem se responsabiliza por fazer lei orçamentária – não somos nós, é o Congresso Nacional – deveria ter tido o cuidado de saber se essa norma estaria compatibilizada ou não com o que determina a regra constitucional. Não me resta, diante do que foi já devidamente explicitado, outra alternativa senão também entender que na melhor das hipóteses resta ambigüidade entre o texto impugnado e a norma constitucional. Só isso, a meu ver, justificaria o julgamento procedente da ação”, votou Corrêa.
Fonte: STF

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