Florianópolis, 29.8.04 – PrejuÃzo é o nome do “produto” que transita sem trepidação e com muita tranqüilidade nas BRs 282 e 470 em SC. Os dois principais corredores de escoamento da produção das regiões Oeste, Serra, Alto Vale e Vale do Itajaà apresentam trânsito livre para as perdas causadas pela falta de melhorias e de modernização dos 1.025 quilômetros de extensão das rodovias em território catarinense.
As duas rotas são para a ligação Bioceânica, tão sonhada pelo governo do Estado, na integração econômica com os paÃses do Mercosul e Chile. Na BR-282, o movimento de cargas de alimentos e grãos chega a 500 mil toneladas por mês. A maior parte que sai do Oeste também circula pela 470, que é o principal eixo do corredor da exportações, através do Porto de ItajaÃ. Devido à importância logÃstica, estas estradas deveriam estar sempre em conservação, diminuindo os custos repassados nos preços ao consumidor.
As despesas com a manutenção de frota e frete representam um acréscimo de custeio que varia de 10% a 30%.
– A perda é incalculável. A falta de melhorias nestas rotas afasta qualquer tipo de investimento empresarial nestas regiões. Falta vontade polÃtica para aplicar recursos aqui. O governo tem R$ 30 bilhões para a recuperação das estradas, mas não faz isso – critica o presidente da Federação das Empresas de Transporte de Cargas de Santa Catarina (Fetrancesc), Pedro Lopes.
O presidente do Fórum Parlamentar Catarinense, deputado federal Fernando “Coruja” Agustini (PPS), afirma que os deputados e senadores do Estado estão empenhados na luta para conseguir verba para estas estradas.
PolÃtica de superávit primário é apontada como causa da escassez
Coruja lamenta a falta de investimentos da União na melhoria das estradas e critica a polÃtica de superávit primário, adotada pelo governo, como limitador da aplicação de recursos.
– Esta situação não é privilégio apenas de Santa Catarina. Estamos fazendo reuniões com empresários e queremos uma audiência com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo Silva, para discutir essas carências – diz.
O presidente da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (Ocesc), Neivor Canton, reclama que as ações para agilizar as melhorias são isoladas. Para ele, reunir vários segmentos em torno desse objetivo.
– O sistema cooperativado atua em todas as regiões e depende das estradas. Estamos perdendo competitividade devido o alto custo – alerta.
BR-280 engole R$ 42 milhões
A BR-280 entre Porto União e São Francisco do Sul é uma sangria de dinheiro esparramada no solo do Norte catarinense: por seus buracos escoam todo ano mais de R$ 42 milhões, levando-se em conta somente o prejuÃzo causados pelos engarrafamentos.
Os cálculos são da Federação das Empresas de Transportes de Cargas no Estado de Santa Catarina (Fetrancesc), segundo o presidente da entidade, Pedro Lopes:
– A hora perdida custa US$ 4. Cerca de oito mil caminhões passam todos os dias na rodovia, perdendo, em média, 1,5 horas no trajeto, sem contar a espera no porto de São Francisco.
Por dia, são perdidos US$ 48 mil, mais de R$ 115 mil. No ano, lá se vão mais de R$ 42 milhões. Para o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas do Planalto Norte Catarinense (Sindiplan), Marcos Rogério Pereira, o preço do frete na região está 20% acima do que poderia ser praticado.
– Além da perda em tempo, há aumento no consumo de diesel, por causa da ausência da terceira faixa, na depreciação do veÃculo, nos freios, enfim, tudo isso é repassado para o preço final – disse.
Os problemas na rodovia atingem todos os setores, mas a maior parte da conta é paga pelo setor de transportes, reclamam os representantes das entidades. O vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Joinville (Setracajo), Alex Breier, sugere ainda danos difÃceis de mensurar, envolvendo o conceito de produtividade, como o tempo perdido para outros fretes. ?
Chão batido e isolamento, a rotina do Extremo-Oeste
Não dá para acreditar que cem quilômetros de estrada de chão fazem parte de uma rodovia federal. O trecho da BR-282, entre o entroncamento com a BR-470 (Campos Novos) e São José do Cerrito, está em condições mais precárias que muitas estradas do interior de qualquer municÃpio catarinense.
A situação deste trecho fez lideranças da região perderem a esperança na reativação das obras, paradas há três anos por problemas judiciais envolvendo a construtora e a União. Várias assembléias públicas foram realizadas. Mas as obras ainda não recomeçaram, apesar da expectativa de serem retomadas esse ano.
– Até agora nós só tivemos perdas. Deixamos de receber investimentos por causa da rodovia. Um supermercado de Lages deixou de abrir uma unidade aqui. Gastamos R$ 20 mil por mês no serviço de transporte de ônibus. É um preço alto para um municÃpio que arrecada apenas R$ 400 mil – reclama o prefeito de São José do Cerrito, Rui de Amorin Ortiz.
Para o superintendente da Agência de Desenvolvimento da Serra (Ageserra), Carlos Eduardo de Liz, a recuperação total da 282 é prioridade da região para fugir de uma situação de isolamento e carência de investimentos.
O percurso de 30 quilômetros, que liga São Miguel do Oeste até ParaÃso, também enfrenta a mesma realidade do trecho serrano. Este trajeto é considerado um importante corredor de relações comerciais com a Argentina e outros paÃses do continente.
– Há 34 anos estamos esquecidos. E isso prejudica não só a região, mas o Estado que perde em torno de 50% dos turistas argentinos que moram na região Norte daquele paÃs – explana o prefeito de São Miguel do Oeste, João Carlos Valar.
O trecho entre Lages e São José do Cerrito, que está sendo construÃdo pelo Batalhão de Engenharia e Construções de Lages, tem dotação orçamentária de R$ 7,1 milhões, com participação de R$ 5 milhões do governo do Estado.
Buracos da BR-101 provocam gargalos
As condições perigosas do trecho não-duplicado da BR-101 têm provocado prejuÃzos inestimáveis na frota de veÃculos responsável pelo escoamento da produção das indústrias instaladas no Sul do Estado. O Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Criciúma e região não possui dados estatÃsticos, mas é só verificar a situação de algumas indústrias para constatar os gargalos oriundos das despesas com a manutenção dos veÃculos.
Um levantamento feito no departamento de logÃstica da Anjo Tintas e Solventes, instalada no distrito de Rio Maina, em Criciúma, aponta para um gargalo com despesas anuais de R$ 40 mil no aperto de molas e troca de cuÃcas e R$ 42 mil com recapagem de pneus de cinco caminhões que trafegam pela BR-101 não-duplicada.
– Esses números não existem em relação aos caminhões da frota que transitam pelo interior de São Paulo nas rodovias Anhanguera e Bandeirantes – compara o presidente da Anjo, Albertino Colombo.
Nesse comparativo vale ressaltar que a troca da bandagem dos pneus da frota que transita pela BR-101 precisa ser feita a cada 14 meses, enquanto os pneus dos caminhões que percorrem o interior paulista passam por esse processo a cada 24 meses.
Manutenção paralisa a frota
Ou seja, uma diminuição de 42% na vida útil do pneu. Além do custo, a manutenção do veÃculo implica na paralisação da frota.
– Isso é feito toda semana, ocupando meio perÃodo nas sextas-feiras. Se totalizarmos esse tempo, verificamos que a frota fica parada 156 dias ao ano – constata Colombo.
O empresário do setor de transportes de cargas, José Luiz Nascimento, relata que até o consumo de combustÃvel sofre influência das condições precárias da rodovia federal. De acordo com Nascimento, o consumo normal seria de 2,8 quilômetros rodados por litro, enquanto a média dos caminhões que trafegam pelo trecho não-duplicado é de 2,3 quilômetros por litro.
Oeste quer campanha para duplicar BR-282
Empresários propõem ação similar à da 101
O caminhoneiro Celso Moras, 36 anos, se surpreendeu ao transitar pela BR-282. Há seis meses que não passava na rodovia. Ao entregar uma carga de farelo em Catanduvas, no Meio-Oeste, foi obrigado a enfrentar os problemas que todos os motoristas reclamam dessa estrada.
– Não sabia que tinha tanto buraco por aqui. Cada vez aumenta mais – diz.
A reclamação do profissional da estrada é facilmente replicada entre os empresários do Oeste. Constantemente, o presidente da Associação Comercial e Industrial de Chapecó (Acic), Elói Bergamaschi, empresta seu tempo para ouvir as reclamações dos dois setores sobre as péssimas condições da BR-282.
Frente a esta comoção unânime na região, a entidade pretende organizar uma campanha de recuperação dessa via, seguindo a mesma mobilização feita em defesa da duplicação da BR-101 Sul.
Bergamaschi diz que a Acic encaminhou ofÃcios ao Departamento Nacional de Infra-estrutura (DNIT) e aos congressistas catarinenses, solicitando empenho na destinação de recursos para obras de reforma.
Ele salienta que empresários do Extremo e Meio-Oeste estão engajados para iniciar uma campanha de sensibilização aos prejuÃzos que a região arca devido à falta de infra-estrutura.
– As novas melhorias têm que priorizar uma duplicação. O nosso frete está encarecido por causa do abandono dessa via. Isso causa um incremento de custo na média de 10% nos produtos – reclama o empresário.
O presidente da Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina e da Cooperativa Aurora, José Zeferino Pedrozo, considera uma falta de respeito ao setor produtivo o abandono dessa rodovia.
Radiografia dos acidentes
Fluxo de veÃculos médio diário
BR- 470: 15 mil veÃculos
BR-282: 4 mil veÃculos
Ano de 2004
BR – 282
Acidentes: 2.080
Feridos: 1.463
Mortos: 75
VeÃculos envolvidos: 3.630
BR-470
Acidentes: 2.208
Feridos: 1.684
Mortos: 94
VeÃculos envolvidos: 4.071
Primeiro semestre de 2005
BR-282
Acidentes: 1.098
Feridos: 845
Mortos: 62
VeÃculos envolvidos: 1.910
BR-470
Acidentes: 1.201
Feridos: 859
Mortos: 55
VeÃculos envolvidos: 2.209
Fonte: PolÃcia Rodoviária Federal
Frete aumenta até 20%, diz Coperio
O diretor comercial da Cooperativa do Rio do Peixe (Coperio) não tem dúvidas quantos aos impactos negativos da BR-282 em seus negócios. Geraldo Ferronato não dispõe de estatÃsticas exatas a respeito, mas calcula que a má conservação e as caracterÃsticas da rodovia na região de Joaçaba fazem com que o frete dos produtos comercializados aumente em, no mÃnimo, 20%.
– O caminhoneiro até evita vir para cá – revela.
Ferronato atribui tal atitude ao excesso de morros e curvas fechadas entre Campos Novos e Vargem Bonita, e, principalmente, às condições do asfalto, com buracos e caimentos inadequados, e ao acostamento precário em diversos trechos.
O resultado desta salada indigesta, afirma o diretor, é, além do aumento dos custos, o excesso de gastos na manutenção da frota da Coperio, que atende pelo menos cinco mil produtores de leite, rações, suÃnos e cereais do Meio-Oeste.
– Sabemos que os recursos são parcos. É preciso organizar a sociedade para tentar algo de bom pela 282 – declara.
Situação semelhante vive o diretor administrativo e financeiro da Celulose Irani, produtora de papel, celulose, resinas, embalagens e móveis, localizada em Vargem Bonita.
Aeroporto seria saÃda para crise
Odivan Carlos Cargnin também dispõe apenas de dados empÃricos sobre as perdas com a rodovia. Segundo afirma, a empresa sofre, porque a maioria de suas fazendas de pinus fica num raio de 25 quilômetros e o deslocamento desta matéria-prima precisa, necessariamente, passar pela BR-282.
Para Cargnin, a construção do Aeroporto Regional do Contestado, cujas tratativas estão a cargo de lideranças da região de Joaçaba, seria uma ótima alternativa para escoamento da produção e fechamento de novos negócios.
– Às vezes, nossos parceiros evitam vir a Vargem Bonita, porque o aeroporto que recebe vôos regulares fica em Chapecó. Só de eles saberem que precisam enfrentar quase duas horas de carro por esta estrada, já se torna um empecilho. Fonte: Diário Catarinense