BrasÃlia, 26.08.03 – Pelo menos 13% dos caminhoneiros que circulam pelas estradas do PaÃs apresentam algum problema de saúde. A razão, aponta levantamento da Triângulo do Sol, concessionária de 442 quilômetros de rodovias no Estado de São Paulo, é a falta de tempo entre as viagens para o motorista cuidar do próprio bem-estar. Entre os problemas mais comuns, dores de dente, lesões na coluna e hipertensão.
A concessionária, que promoveu oito campanhas de avaliação médica de caminhoneiros visando diminuir o número de acidentes, aponta que os malefÃcios decorrem das constantes viagens a que se submetem os motoristas. Em outras palavras, trocam a saúde por uma renda maior que permita quitar as prestações dos caminhões. “Os problemas surgem porque os caminhoneiros precisam trabalhar mais”, explica o inspetor De Lucas, do 1º Distrito Regional de PolÃcia Rodoviária Federal, responsável pelo DF e Entorno.
As queixas dos caminhoneiros atestam a rotina nociva à saúde. Além dos solavancos causados pelos buracos, outro vilão do bem-estar que destacam é a carga de horário – transporte de produtos em caráter de urgência. Júlio César Pelogia, 22 anos, passa pelo menos um mês longe de casa, em Apucarana (PR). Esse é o perÃodo que ele terá de esperar para tratar de uma dor de dente. “O jeito é aguentar até a volta”, conforma-se.
A corrida contra o tempo é, muitas vezes, imposta pelo contratante. Como prêmio, os fornecedores oferecem gratificações ao motorista que entrega a carga antes do prazo combinado. “Isso, para o caminhoneiro, significa a possibilidade de quitar as prestações do veÃculo. Se atrasam uma parcela, começam o mês seguinte devendo R$ 8 mil”, exemplica De Lucas.
Os números coletados pela PRF revelam mais sobre a saúde do caminhoneiro. Em três operações médicas promovidas nas estradas do DF, constatou-se que a hipertensão é o principal mal que aflige os motoristas. Avaliou ainda que 30% dos motoristas estão acima do peso ideal. As razões para tanto são o excesso de horas ao volante – 60% dos avaliados dirigem mais 12 horas por dia – e a má alimentação.
Mesmo livre das prestações, Dorival de Arruda, 42 anos, não pôde evitar os problemas de coluna. Há oito anos, ele enfrenta buracos, solavancos e trepidações ao volante de seu Mercedes, modelo 1978. “Quando estou sentado não dói. Mas, à s vezes, não consigo levantar para assinar a nota fiscal com a empresa”, conta. Nessas horas, a esposa e companheira de viagem Andréia Souza assume a tarefa.
Furto de carga, o temor maior – Os números são escassos e insuficientes para traçar um panorama da violência sofrida por caminhoneiros. Restam, no entanto, os relatos daqueles que, longe da proteção da polÃcia, se vêem arrancados da boléia e forçados a ver assaltantes carregarem a carga. “Ser caminhoneiro é ilusão”, queixa-se, Júlio César Pelogia, 22 anos, há quatro na estrada.
No Distrito Federal, nem sindicato nem as autoridades responsáveis pela fiscalização possuem dados sobre a questão porque “a chegada dos relatos é esporádica”, conta Flavio Rodrigues, gerente-administrativo do Sindicato dos Caminhoneiros Autônomos do DF.
Os 131 agentes do 1° Distrito Regional de PolÃcia Rodoviária Federal (PRF) não bastam para vigiar toda a jurisdição, que abrange um raio de mais de 300 quilômetros a partir do DF.
O mineiro Dorival de Arruda já viajou por todo o PaÃs. Hoje evita rodar na madrugada. Há alguns anos, ele aceitou fazer o transporte de dois tratores no interior do Pará. Ao chegar ao destino, o dono do equipamento não estava para recebê-lo. Esperou por dois dias até receber conselho de um amigo. “Aqui o pessoal mata para ver o tombo. Tome cuidado”, revela. Ele partiu.
Há um mês, o catarinense Adelino de Amaral, 43 anos, passou quatro horas amarrado ao pé de uma árvore à s margens da Rodovia D. Pedro, no interior de São Paulo. Ele carregava botas de borracha de São Paulo a Belém. Passou a madrugada ouvindo o bandido engatilhar o revólver que apontava para sua cabeça. “Na estrada não me sinto seguro nem protegido”, reclama.
Liberado pela manhã, encontrou o caminhão à beira da estrada com a carga intacta. Pelo atraso na entrega ainda teve de aturar as reclamações do contratante. Da estrada, Amaral, como é conhecido, não guarda boas lembranças. Sente fortes dores na coluna devido à s horas no volante. Na quinta-feira, a mãe faleceu. “Nem sei se ela foi sepultada”, contou, no dia seguinte. Amaral aguardava, no Núcleo Bandeirante, por um novo carregamento.
Há ainda o alto risco de acidentes. No DF, são mais perigosas a via Epia, a Estrada Parque do Contorno, a Estrutural e a BR-040, onde houve 163 acidentes, dos quais 27 envolvendo caminhões, apenas em julho. E duas mortes. Fonte: Jornal de BrasÃlia