Caminhoneiros: paixão tarifada

Londrina, 13.3.06 – A cobrança de pedágio é hoje a principal barreira entre os caminhoneiros e sua grande paixão: a vida nas estradas. Muitos alegam que não abandonam a profissão por falta de alternativas. As queixas sobre os altos custos e os fretes baixos são comuns. Contudo, a maioria diz que gosta de viver pelas estradas do País. Mesmo com tantas dificuldades.
Ainda jovem, mas já experiente no ramo, o caminhoneiro José Carlos Tarabaica Junior, 25 anos, de Palmas, diz que não consegue deixar a boléia. ??Nós só estamos nisso porque gostamos. Não consigo ficar sem. Já tentei parar e voltar a trabalhar na cidade, de motorista mesmo. Só que o salário é menor??, conta.
E quando o assunto é trabalhar longe de casa, Tarabaica fala com conhecimento de causa. Motorista de uma empresa, acostumou-se às longas viagens, como esta, de três dias, que o leva da Lapa, no Paraná, ao Recife, em Pernambuco. A seguir, deve passar dois meses fazendo fretes nas regiões Norte e Nordeste. Mesmo confiante de que vai continuar no ramo por muito tempo ainda, ??até quando aguentar??, Tarabaica avalia que, ??por causa do pedágio, o caminhoneiro autônomo está aguentando um ou dois anos, no máximo. Muitas vezes, acaba tendo de vender o caminhão??.
Para se manter na estrada, no entanto, os motoristas são obrigados a fazer verdadeiras ginásticas financeiras e a contar com bastante ajuda. Cada centavo economizado é importante. Ainda mais quando o sustento da família sai do lucro obtido com o caminhão.
Além de pagar as contas da casa, Claudino Rodrigues, 53, de Ijuí (RS), quita as mensalidades da faculdade de medicina da filha com os ganhos dos fretes. A maior queixa dele é a relação custo/benefício, já que ??nem todas as pedagiadas estão em boas condições?.
Para Rodrigues, o trecho de Curitiba a Lapa é curto para o valor do pedágio. ??Tem de ter pedágio, só que um pouco mais barato. Eles pegaram a estrada pronta aqui (BR-476), conservam a grama nas beiradas e tapam os buracos. Não tem nem acostamento??, critica. O custo, para usar 20 quilômetros de rodovia concessionada, como foi o caso de Rodrigues, é de R$ 36,00.
A regra para driblar o que consideram cobrança excessiva é usar a criatividade. Poucos metros antes da praça de Arapongas, na BR-369, João Couto Sobrinho, 58, pára no acostamento para recolher um dos eixos de sua Scania 124G-420. Com isso, paga uma tarifa menor. ??Cada centavo que a gente economiza é importante??, ressalta. E ele mostra o porquê. O frete de R$ 2 mil é praticamente consumido todo pelas despesas com combustível, pedágio, manutenção do veículo e alimentação. Para o motorista, sobram apenas R$ 160,00, obtidos após dois dias na estrada, levando um contêiner de Paranaguá para Maringá.
Outra forma de economizar é contar com o apoio de postos de combustíveis de beira de estrada. Em Santo Antônio da Platina, um estabelecimento oferece um ??brinde?? para o caminhoneiro que abastecer no local. Cada litro de óleo diesel significa um centavo de bônus para o caminhoneiro. Para encher um tanque, são gastos de 250 a 300 litros. Esta quantia significa praticamente uma refeição no restaurante vizinho. ??A gente está ajudando. Quando chega a hora de almoço e do jantar, às vezes a gente dá até a refeição para o caminhoneiro??, relata o gerente do posto, Adilson Paulo da Silva, 34. ??A gente diminui o lucro para dividir, porque as coisas estão difíceis para todos??, acrescenta.

Comerciantes: prejuízos acumulados

Os comerciantes que tiram o sustento de estabelecimentos situados às margens das estradas pedagiadas do Estado também são bastante prejudicados pela concessão de rodovias. A cobrança é apontada por muitos como a principal causa dos prejuízos acumulados desde o início da cobrança. Não são raros casos de profissionais que, quando têm alternativa, querem deixar o ramo, justificando que a ??concorrência?? das cancelas está inviabilizando os negócios.
Proprietária de uma lanchonete entre a praça de Floresta e a ponte do Rio Ivaí há 20 anos, a comerciante Sônia Maria Montezol, 46 anos, lamenta a queda de movimento desde a implantação do pedágio. Quando não havia a cobrança, clientes de cidades vizinhas como Floresta, Itambé e até Maringá desciam para a lanchonete nos fins de semana. Com a tarifa de R$ 6,60 para carros, a diminuição da clientela foi, segundo ela, de cerca de 80%.
Por outro lado, ela admite que houve redução no número de acidentes. ??Antes eu que tinha de levar os acidentados. Hoje eu não vou nem no local. Eu só ligo e a Viapar vem em cinco minutos??, diz. Sônia fala com conhecimento de causa. O filho dela foi uma das vítimas socorridas pela concessionária. Em 1999, Gildo Montezol, 25, estava no carro de um amigo, que perdeu a direção e chocou-se contra o barranco. O jovem fraturou a coluna e teve atendimento da Viapar, mesmo fora do trecho da concessionária. ??Se não fosse a Viapar seria mais complicado o atendimento. Até quando tem assalto eles vêm??, afirma.
Para não deixar de vender, Sônia e Gildo fazem entregas depois do pedágio, especialmente para clientes de Maringá. A manobra é possível porque ela possui uma credencial de proprietária rural para pagar R$ 6,60 por mês, o valor de uma tarifa, e tem o trânsito liberado o mês todo. Ela diz que, após o término da ampliação da ponte sobre o Rio Ivaí, em cerca de um ano, deve vender o comércio e tentar a vida em Portugal. ??Se barateasse eu continuaria trabalhando normalmente.?? A mãe dela, que também tem comércio do outro lado da ponte, deve deixar o ramo.
Em Ivailândia, Celso Luís Maximiniano, 44, trabalha como vendedor numa barraca de artigos variados. A maior parte do material – como panelas de alumínio – vem de fábricas da região. Apesar do movimento razoável, as vendas estão fracas. ??A maioria dos motoristas pára mais para olhar. Aqui chega muita gente reclamando que faz a contagem do dinheiro e tem de separar o do pedágio. Acaba não sobrando para gastar com a gente??, diz. Mesmo assim, apóia a cobrança, especialmente com o ínicio das obras de alargamento da ponte sobre o Rio Ivaí.
Trabalhando na barraca da mãe, Márcia Lopes, 39, tem um concorrente ainda mais voraz. O estabelecimento na beira da Rodovia Argus Thá Heyn, a PR-407, que liga Praia de Leste a Paranaguá, é a fonte de sustento da família há 40 anos.
Depois da alta do preço da praça Caminho do Mar, que fica em São José dos Pinhais, o tráfego caiu drasticamente. A redução do lucro da comerciante foi ainda maior. O fluxo de veículos desvia-se pela estrada Alexandra-Matinhos, para fugir do pedágio. No verão, segundo ela, as vendas deveriam ser bem maiores. A conseqüência é que o estoque de chapeús de palha e banana está praticamente parado. Outra dificuldade é que a concessionária, segundo ela, cria obstáculos para que os nativos montem comércio na beira das estradas. ??A gente é pobre. Precisa aproveitar as vendas da temporada para sobreviver. A maioria dos nativos está revoltada com essa situação??, queixa-se Márcia.

Concorrência

Diversidade é o forte da barraca de Sebastiana Gomes, 56, que trabalha na BR-369, próximo a Uraí, entre Cornélio Procópio e Londrina. Há 15 anos, ela conquista o sustento da família com a venda de banana, uva, tipos diferentes de castanhas, melão e caldo de cana. O problema, segundo ela, é a concorrência. Dezenas de barracas semelhantes espalham-se pelo trecho. Mas o maior concorrente oferece como produto apenas uma pista sem buracos e as laterais roçadas. É a concessionária Econorte, cuja praça de Jataizinho cobra R$ 8,60 para a passagem de carros. ??Antes do pedágio, o movimento era bem melhor, passavam mais carros. Agora, por causa do pedágio, que é muito caro, a freguesia acaba gastando o dinheiro lá (na praça de cobrança). Tem freguês que diz que não pode comprar mais por causa do pedágio??, lamenta.

A situação das rodovias trecho a trecho

1 – Londrina – Nova Londrina: A primeira estrada pedagiada do roteiro é a BR-369, trecho sob concessão da Viapar. A praça de Arapongas fica a poucos quilômetro do Centro de Londrina e o custo é de R$ 4,40 para carros. A pista é dupla, sem canteiro central. No entanto, o acostamento é estreito e praticamente não comporta um carro popular com segurança. Na praça de Mandaguari, BR-376, o valor é o mesmo. Após o trevo para Umuarama, a pista volta a ser dupla, agora com canteiro central. A sinalização de boa qualidade contrasta com irregularidades no asfalto. No trevo de Mandaguaçu, novamente pista simples. Não há terceira faixa, nem nos trechos de subida. Mesmo assim, o motorista percebe logo o aviso do pedágio da Presidente Castelo Branco: R$ 6,00 para carros. Pouco depois, no trevo de Floraí, o número de remendos na pista impressiona. O resultado é turbulência durante a viagem. A maior parte do trecho até Nova Londrina possui terceira faixa nas subidas.

2 – Maringá – Cascavel: O destino agora é a Rodovia Avelino Piacentini, a PR-317, início do trecho de Maringá a Foz do Iguaçu. Como todas as praças fazem a cobrança nos dois sentidos, é necessário pagar novamente o pedágio da Presidente Castelo Branco (R$ 6,00). Nesta estrada, o asfalto já é de melhor qualidade e existe mureta de proteção entre as pistas duplas. Há recapeamento e pintura novos na altura do trevo de Ivatuba. Em Floresta, o pedágio custa R$ 6,60. Na seqüência, a primeira obra de vulto: a ampliação da ponte sobre o Rio Ivaí. Após a passagem pelo contorno de Campo Mourão, retomamos a BR-369. Placas indicando telefone de emergência são constantes. Os pedágios de Campo Mourão e Corbélia custam R$ 6,60 cada. O trecho tem asfalto sem buracos e com poucas turbulências. Há obras de restauração em três quilômetros dessa pista. Depois da praça de Corbélia, há muitas faixas contínuas e pouquíssimas adicionais. A chegada a Cascavel mostra um problema comum de vias rápidas em trechos urbanos. Pedestres e ciclistas arriscam-se no asfalto, mesmo com a existência de passarela. Já o entroncamento das rodovias BR-369 e Engenheiro Tasso da Costa Rodrigues, a BR-277, é um dos mais complicados de todo o percurso, em especial pelo intenso movimento de caminhões.

3 – Cascavel – Foz do Iguaçu: Este é o último ponto sob responsabilidade da Viapar e início do trecho até Foz do Iguaçu, da concessionária Rodovia das Cataratas. Até a cidade das três fronteiras são mais duas praças, que representam custo de R$ 12,40. Antes de atingir a praça de Céu Azul, há propaganda de obras de duplicação feitas no trecho da Serra do Mico. Na cancela: R$ 5,40. A pista, após o limite entre Matelândia e Medianeira, é dupla e de boa qualidade. Na praça de São Miguel do Iguaçu, a tarifa custa R$ 7,00. Os 25 quilômetros até Foz são de pista dupla, com canteiro central e boa sinalização.

4 – Cascavel – Guarapuava: A terceira praça de pedágio da BR-277, também da Rodovia das Cataratas, fica em Cascavel e custa R$ 5,80 para carros. Há trechos fresados, que aumentam a aderência ao asfalto. A reclamação dos usuários é sobre o número insuficiente de terceiras faixas. A seguinte fica em Laranjeiras do Sul e também custa R$ 5,80. A sinalização é excelente, principalmente em curvas perigosas. Na praça de Candói, o custo é de R$ 5,80.

5 – Guarapuava – Porto Amazonas: Ainda na BR-277, a primeira praça de pedágio da concessionária Caminhos do Paraná fica em Relógio, cujo valor é R$ 6,40. A maior parte dos trechos é de pista simples, especialmente na Serra da Esperança. Na praça de Irati, o custo é de R$ 5,60. O que chama a atenção é a caixa de desaceleração situada ao lado das cancelas, que ??deve ser usada?? por caminhoneiros que fiquem sem freio. É a prova de que, como alguns profissionais apontam, a praça de cobrança está em local inadequado. Em Porto Amazonas fica a única praça da Caminhos do Paraná na BR-277, com custo de R$ 6,40. Mesmo perto da cancela, há falhas nos olhos de gatos. A partir da cidade até o entroncamento com a BR-376, as condições do asfalto e sinalização são melhores.

6 – Porto Amazonas – Curitiba: A partir do entroncamento entre as rodovias BR-277 e BR-376, o trecho é da Rodonorte. Depois de oito quilômetros, a única praça até Curitiba é São Luís do Purunã, que custa R$ 4,70. O trecho é de pista dupla, com asfalto de boa qualidade e canteiro central.

7 – Curitiba – Lapa: A BR-476 é uma das principais vias de acesso da Capital ao Sul do Estado e a Santa Catarina. Logo após o trecho urbano de Araucária, inicia-se a concessão da Caminhos do Paraná até a Lapa. Até o limite com Contenda, há pistas simples e terceira faixa. Depois disso, um dos trechos com asfalto de pior qualidade em todo o Estado. Não há buracos, mas ondulações na pista. O acostamento também é precário. Na praça da Lapa, o valor é de R$ 6,40. A concessionária cuida também da Rodovia Deputado Olívio Belich, a PR-427. São 42 quilômetros de pista simples e estreita, onde os pedestres têm de disputar espaço com caminhões e carros. Praticamente não há pontos de ultrapassagem. A concessão termina em poucos quilômetros.

6 – Curitiba – Paranaguá: Uma das principais vias de acesso ao litoral, a BR-277, entre Curitiba e Paranaguá, é uma das melhores estradas do Estado. Para passar pela praça Caminho do Mar, o preço é R$ 10,60, o valor mais alto do Estado. Um caminhão de sete eixos, por exemplo, chega a pagar R$ 62,30. O trecho é de pista dupla, ora com mureta, ora com canteiro central. A Ecovia cuida também de trecho da Rodovia Engenheiro Argus Thá Heyn, a PR-407, saindo de Paranaguá, com destino a Matinhos. A maior parte é de pista simples, com acostamento em bom estado.

8 – Curitiba – Ponta Grossa: O trecho conta com duas praças de pedágio: São Luís do Purunã e Witmarsum, ambas na BR-376 e da Rodonorte. Os preços são respectivamente de R$ 4,70 e R$ 6,60, com estrada de boa qualidade.

9 – Ponta Grossa – Jaguariaíva: Perto de 110 quilômetros da PR-151 separam Ponta Grossa de Jaguariaíva. Até Castro, a pista é dupla e com canteiro central. O asfalto é de boa qualidade. A cidade de Carambeí fica às margens da movimentada estrada. Nas proximidades, há diversos trechos remendados. Na praça de Carambeí, o preço é R$ 5,50. Após a passagem por Piraí do Sul, a pista volta a ser simples, com trechos de terceira faixa. Obras recentes acabaram com os buracos que existiam no trecho, mas o motorista e passageiros ainda podem sentir a trepidação dos veículos. A praça de Jaguariaíva fica pouco antes do final do trecho de concessão. O custo é de R$ 4,20. São dois locais de cobrança em pouco mais de 100 quilômetros concessionados da PR-151.

10 – Ponta Grossa – Relógio: O entroncamento da PR-151 com a BR-373 marca também o final do trecho de concessão da Rodonorte e o reinício da Caminhos do Paraná. A ligação entre Ponta Grossa e Relógio é responsabilidade da Caminhos. A pista é simples com ondulações e acostamento em apenas um lado, em grande parte da estrada. Na praça de Imbituva, carros pagam R$ 5,60. Em Guamiranga, a qualidade melhora um pouco, mas não persiste até o final do trecho de concessão, em Relógio.

11 – Ponta Grossa – Londrina: Entre Ponta Grossa e Apucarana, a pista é simples, com terceira faixa e sinalização vertical e horizontal, inclusive olhos-de-gato, de boa qualidade. O trecho da BR-376 é da Rodonorte. A primeira praça é a de Tibagi, cujo preço é R$ 6,20. Trechos de curvas perigosas são duplicados. Antes de Apucarana, mais duas praças: Imbaú e Mauá da Serra, que também custam R$ 6,20. Após o limite entre Ortigueira e Mauá da Serra, a pista na Serra do Cadeado é dupla e com canteiro central. Em Califórnia, volta-se para a BR-369 e é retomada a concessão da Viapar até Apucarana. Depois, a pista até Londrina é dupla e de boa qualidade. Só que no caminho ainda é necessário passar novamente pela praça de Arapongas.

12 – Londrina – Porto Charles Nauffal: O caminho entre Londrina e a divisa com o Estado de São Paulo pode ser feito pelas rodovias PR-545 e PR-323. O trecho da Econorte conta com subidas com terceira faixa e sinalização de boa qualidade, principalmente nas proximidades da ponte sobre o Rio Tibagi. Perto da praça de Sertaneja, onde o preço é R$ 7,40, a pista é de excelente qualidade. A PR-090, caminho alternativo entre Ibiporã e Sertanópolis, também recebe conservação da concessionária. A pista é estreita, praticamente sem acostamento ou pontos de ultrapassagem. Já o Contorno de Ibiporã é novo e não apresenta problemas.

13 – Londrina – Santo Antonio da Platina: Entre as duas cidades, pelas rodovias BR-369 e BR-153, há duas praças: Jataizinho e Jacarezinho. A praça de Jataizinho é a segunda mais cara do Estado: R$ 8,60 para carros. Diferentemente do trecho supervisionado pela Ecovia no litoral, que mantém o pedágio de preço mais elevado, a pista é simples, com trechos de terceira faixa. Sinalização e pintura são de boa qualidade. Em Cambará há uma praça desativada. Depois, em Jacarezinho, a última praça da Econorte. O preço é R$ 7,90. Uma parte da BR-153 também se inclui na malha viária sob responsabilidade da Econorte. No perímetro urbano de Santo Antônio da Platina há passarela e lombadas para facilitar o tráfego de pedestres.

Equação matemática define valores das tarifas

O diretor-regional da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) no Paraná, João Chiminazzo Neto, afirma que a opinião da maioria dos usuários de que o pedágio é caro está diretamente ligada à alta carga tributária existente hoje no País, que também afeta outras tarifas. ??Qualquer usuário de serviço público, ao ser perguntado sobre o valor da tarifa, naturalmente sempre se manifesta achando que é caro. Não podemos considerar que nada é caro ou barato sem o estabelecimento de uma comparação entre custo e benefício.??
Chiminazzo explica que a definição dos valores da tarifa foi feita pelo governo estadual, nas licitações, e o cálculo do reajuste anual resulta de uma equação matemática, na qual são levados em conta fatores como receita, volume de tráfego, custos operacionais e das obras. Nele são aplicados os índices relativos à terraplanagem, pavimentação, obras de arte (viadutos, pontes etc.), custo da construção civil e de consultoria, entre outros.
??É preciso entender??, acrescenta, ??que as empresas foram convidadas a participar da licitação e a assumir todas as obrigações estabelecidas em contrato. Não tomaram as estradas de assalto??. Segundo o diretor, a versão estadual da cobrança de pedágio nasceu após a criação do programa brasileiro de concessões, por meio de concorrência pública internacional. O início foi em 1996, quando foram definidas as empresas vencedoras. No ano seguinte, houve a estruturação. Os trabalhos de preparação foram iniciados em janeiro de 1998. A cobrança começou em junho do mesmo ano.
Em julho de 1998, o Governo Estadual determinou a redução da tarifa em 50%. Logo após a oficialização, de acordo com a ABCR, as concessionárias entraram com ação judicial e obtiveram uma liminar em 21 de agosto, que as desobrigava da realização de investimentos e reduzia as verbas do poder concedente em 50%. A demora de um ano e oito meses para recomposição das tarifas decorreu do trâmite da ação na Justiça Federal.
A ABCR ressalva que a tarifa somente foi recomposta após decisão, em março de 2000, que determinou ao Estado retomar o valor original e restabelecer o inicial equilíbrio econômico e financeiro. Essa decisão motivou o DER a fazer nova proposta, considerando a redução em torno de 20% para as tarifas por eixo comercial e o conseqüente novo cronograma.
Entre as obrigações previstas em contrato, de acordo com informações da ABCR, incluem-se o cumprimento do cronograma das obras de recuperação das rodovias e de manutenção; prestação de serviços adicionais, como atendimento pré-hospitalar; resgate com guincho (remoção de veículos em pane); prestação de informações sobre as condições de tráfego; atendimento de incidentes (deslizamentos, queimadas, cargas derramadas, animais mortos etc.); pesagem de veículos e apoio ao policiamento rodoviário, entre outras.
Sobre a rapidez da Justiça em julgar os questionamentos, envolvendo o pedágio, Chiminazzo afirma que o Poder Judiciário tornou-se ??mais célere pelo maior grau de conhecimento da matéria e sucessivas ações similares, e ainda por entender que a motivação do atual governo é política e não técnica ou econômica.?? João Chiminazzo Neto comenta ainda que as possibilidades para redução do valor do pedágio estão nas mãos do governo. ??Para rever a tarifa é necessário rever todo o contrato. A equação entre receita e custo das obras e manutenção é simples. Não há mágica??, conclui. (F.R.F.)

Modelo precisa de aperfeiçoamento

Entre as entidades representativas de diversos setores da sociedade paranaense, as críticas ao pedágio variam de incisivas a moderadas. Todas, no entanto, indicam que o modelo precisa ser melhorado. O presidente da Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar), Anselmo Trombini, afirma que o diálogo entre governo, usuários e concessionárias sobre as tarifas deve ser estimulado.
??O custo (do pedágio) é alto, mas o custo decorrente de más condições de estradas é maior. As despesas com o pedágio acabam repassadas para o consumidor final??, diz Trombini. ??Nós já pagamos muitos impostos para que as estradas sejam bem conservadas sem pedágio. Há uma falha do poder público??.
A Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar) estima que o pedágio representou R$ 78,24 milhões a mais nos custos do escoamento da safra do Estado em 2005. Essa quantia significou um aumento de 14,76% em relação ao ano anterior. A entidade critica o modelo de pedágio no Paraná, onde os usuários custeiam as obras que as concessionárias são obrigadas por contrato a fazer.
??Em países desenvolvidos, primeiro os serviços são disponibilizados e só depois se inicia a cobrança??, argumenta Robson Mafioletti, analista técnico e econômico da Ocepar. A entidade sugere a criação de uma agência reguladora do pedágio, na qual concessionárias, governo e representantes dos usuários tomariam decisões sobre obras nas estradas e reajustes de tarifas.
??Apenas 1/3 do que as concessionárias arrecadam no Paraná é investido nas estradas??, critica Acyr Mezzadri, coordenador estadual do Fórum Popular contra o Pedágio. ??No Brasil, o pedágio opera num modelo nocivo, porque as empresas exploram rodovias públicas, construídas com dinheiro público. As concessionárias deveriam devolver as estradas para o Estado??.
Diumar Bueno, presidente do Sindicato dos Caminhoneiros do Paraná (Sindicam) e da Federação Nacional dos Caminhoneiros (Fenacam), comenta que, para a categoria, o pedágio representa entre 20% e 25% sobre o valor do frete. ??Para os caminhoneiros, a solução seria que as empresas que contratam serviços de transporte respeitassem a lei do vale-pedágio, que existe desde 2002. Mas apenas as grandes e mais organizadas a cumprem. Muitos caminhoneiros ficam com o prejuízo??, diz Bueno.

Necessidade ou maquiagem?

Terrenos roçados nas margens, placas refletivas e pintura das canaletas de escoamento de água. Para quem não tem conhecimento técnico, é difícil diferenciar entre o que realmente é necessário para garantir a qualidade das estradas e o que pode ser considerado apenas ??maquiagem??. Segundo o superintendente regional do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) em Londrina, Wilson Luiz Bazzo, existem algumas formas usadas pelas concessionárias para conferir uma aparência mais agradável às vias. Um exemplo citado é a pintura das canaletas.??São providências que não são exatamente necessárias, mas que servem para mostrar que a estrada está bonita. É óbvio que isso é uma maneira de impressionar o usuário??.

Para a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), no entanto, a necessidade existe. As canaletas, como exemplifica a entidade, são consideradas itens de segurança nas estradas e servem para a drenagem superficial do pavimento, conduzindo a água pluvial e reduzindo o desgaste do asfalto. Contudo, o melhor é fiscalizar. Para isso, o DER mantém uma espécie de parceria com os usuários. Qualquer motorista pode denunciar possíveis defeitos na malha viária, de sinalização, entre outros. A responsabilidade de cobrar providências e soluções das empresas é do próprio DER.

Diariamente, uma equipe da Tecpar, autarquia do Governo Estadual, percorre as rodovias do Estado para verificar as condições de tráfego. Quando algum defeito é constatado, o DER notifica a concessionária para apresentar uma solução no prazo de 30 dias. No caso da Região Norte, as notificações são constantes, mas a Econorte nunca deixou de fazer as adequações solicitadas ou recebeu multa.

Por outro lado, as concessionárias mantêm um livro de reclamações destinado aos usuários nas bases operacionais, casas do motorista e cabines de cobrança. A equipe do DER é responsável pela triagem e encaminhamento das reclamações. As queixas também podem ser feitas por meio do telefone e da Internet. Mesmo com os diversos canais de comunicação, o número de queixas ainda é baixo. No final do ano passado, foram quatro em dois meses. Para o engenheiro do DER, Carlos Fumiu Yamamura, a estatística é resultado do ??comodismo?? dos usuários. ??É que as pessoas não querem perder dez minutos para preencher o livro??, avalia. As reclamações também são encaminhadas para a Polícia Rodoviária.

O pedágio em outros países

De acordo com o assessor técnico-econômico da Faep, Nilson Camargo, o principal problema do modelo de pedágio instituído no Paraná são as altas tarifas. ??Não somos contra a cobrança, mas contra os valores praticados e a forma como são feitos os reajustes??, declara. Ele comparou o pedágio paranense com o sistema de outros países. ??Na Europa, principalmente, existem vias alternativas às estradas pedagiadas, diferentemente do que ocorre aqui??, critica. O estudo feito pela entidade mostra detalhes sobre os modelos de pedágio de outros países.

Estados Unidos – No início dos anos 90, as estradas pedagiadas nos Estados Unidos representavam 6,5% do sistema rodoviário interestadual e 7% do tráfego. Atualmente, a extensão norte-americana de rodovias concedidas não passa de 7.150 km, sendo que a malha total pavimentada dos EUA ultrapassa 5 milhões de quilômetros.

Espanha – Atualmente, a rede concedida compreende 2.000 km de rodovias, operadas por oito concessionárias, das quais seis são privadas e duas estatais. O sistema de concessões praticado na Espanha é misto e está sob intensa regulamentação. O poder público, que define as tarifas, tem grande participação nas concessionárias, não só por meio do controle acionário, mas também por meio de um delegado nomeado por decreto e encarregado de acompanhar as atividades dessas empresas.

França – Compreendendo 5.726 km de vias expressas, a rede concedida francesa é gerida por nove empresas, das quais oito são de economia mista, controladas pelo poder público, e apenas uma é privada, responsável por 700 km da malha. A coordenação fica por conta da entidade pública ADF – Autoroutes de la France -, que detém 34% do capital das empresas. O modelo francês caracteriza-se pelo pragmatismo, relação de confiança entre os parceiros e pela participação de grandes empresas, estimuladas por incentivos econômicos.

Itália – O país possui 6.175 km de vias expressas concedidas, gerenciadas pela SPA Societá Autostrade, de economia mista, com 51% de ações estatais. Desse total, apenas 3.200 km são concedidos a outras administrações públicas e particulares (vias de menor importância). A construção e a manutenção das rodovias são financiadas pelo pedágio. Apenas uma entre as 25 concessionárias italianas (a que explora o trecho de Turim a Milão, de 127 km) é privada. As restantes contam com capital público e apoio de organismos regionais ou locais.

Pedágio no Paraná: mais custo do que benefício – Poderia ser um valor suportável. Afinal, o pedágio é necessário em um país cujo serviço público é de baixa qualidade. Ou um valor alto, mas que apresentasse retorno compatível. Nem uma coisa, nem outra. O pedágio é caro, complica a vida das pessoas e os benefícios muitas vezes podem se resumir a uma bem feita ?maquiagem?. Em alguns trechos, nem a isso

Desde 7 de junho de 1998, os paranaenses são obrigados a pagar para circular por algumas das mais importantes estradas do Estado. Foi nesse dia que as primeiras praças de pedágio do Anel de Integração começaram a funcionar. Hoje, são seis concessionárias atuando em 27 áreas de cobrança nas rodovias federais e estaduais do Paraná.

A melhoria das condições de tráfego e da ??aparência?? de diversos trechos, no entanto, pode esconder problemas graves. O alto custo do pedágio é responsável por mudanças drásticas na vida de muitos paranaenses, que se sentem vítimas da política de concessão de rodovias.

Outros reconhecem as melhorias promovidas pelas empresas. Mas, nem assim, o pedágio deixa de ser alvo de críticas. A principal queixa é contra as tarifas praticadas nas mais diversas praças. No único local de cobrança entre Curitiba e o litoral – a praça Caminho do Mar – o preço para carros é R$ 10,60. Um caminhão de sete eixos paga R$ 62,30.

As condições das estradas pedagiadas foram conferidas de perto por uma equipe da Folha de Londrina. Em cinco dias, a reportagem percorreu todos os quase 2.500 quilômetros dos trechos concessionados, trazendo histórias sobre as mudanças que a cobrança acarretou na vida de muitos usuários.

Uma cobrança que ainda é questionada na Justiça. Por isso, cartazes e placas nas praças sugerem que os usuários guardem os recibos para um possível ressarcimento futuro. Também foi verificada a qualidade do atendimento prestado pelas concessionárias e o nível de abertura para comunicação de eventuais queixas dos motoristas.

Dois casos práticos mostram que há méritos e defeitos. Enquanto o socorro para a retirada de um carro, que despencou da ribanceira em Ortigueira, foi rápido e eficiente; um grupo de motoristas de caminhão teve de esperar socorro por mais de três horas na Serra da Esperança, perto do pedágio de Relógio.

Acompanhe, a seguir, histórias, flagrantes e avaliações recolhidas pela reportagem da Folha ao longo das estradas pedagiadas do Paraná.

O que se diz sobre o pedágio

– Apenas 1/3 do que as concessionárias arrecadam no Paraná é investido nas estradas. (Fórum Popular contra o Pedágio)

– O pedágio é lesivo ao público em geral porque os custos são repassados para os preços das mercadorias. Quem não usa também está pagando.(OAB)

– O problema do pedágio no Paraná são as altas tarifas e a forma como são feitos os reajustes. (FAEP)

– Com recursos de impostos, como o IPVA e a CIDE, é possível manter e ainda ampliar as estradas. (DER)

– Deveria ser criada uma agência reguladora do pedágio, com participação do governo, concessionárias e usuários. (Ocepar)

– Motorista de Londrina paga mais caro por quilômetro rodado. (DER/Londrina)

– A opinião de que o pedágio é caro tem a ver com a alta carga tributária do País, que também afeta outras tarifas. (ABCR)

Reflexo

Os agricultores formam uma das classes mais prejudicadas pelo pedágio. O prejuízo é ainda maior para quem produz perto das praças de cobrança. Em Floresta, o caminhoneiro Márcio Martins, 26 anos, é responsável pelo transporte da produção do campo para a cidade, onde as cargas são repassadas para os fretistas. Nas cinco viagens diárias até o centro de distribuição, o custo é de R$ 280,00. O reflexo, claro, é aumento no preço do produto. Em Alto Paraná, o lavrador Manoel Alves do Amaral (foto), 60, acompanhou de perto as mudanças na Rodovia BR-376, desde os tempos da estrada de terra. Exceção, Amaral considera que o preço do pedágio está ??bom.?? Mas adverte: ??Só não pode é subir.??
Rodovias poderiam ser mantidas só com impostos – Os contratos de concessão de rodovias, firmados pela gestão anterior do Governo Estadual e particulares, são favoráveis às empresas que administram as estradas. A opinião é do diretor-geral do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) no Paraná, Rogério Tizzot. Para ele, os recursos arrecadados com impostos são suficientes para manter as rodovias.
??Defendemos que, com recursos de impostos como o IPVA e a CIDE, é possível manter e ainda ampliar as estradas??, afirma. Ele revelou que obrigações das concessionárias foram retiradas do contrato depois que o Governo Estadual determinou, em 1998, a redução de 50% do valor da tarifa. ??Hoje, se a gente determinasse a redução, no dia seguinte a Justiça concederia liminar cancelando essa ação. Por que naquela época as empresas não foram à Justiça e a redução vigorou por um ano e oito meses???, questiona.
Segundo Tizzot, estima-se que as concessionárias tenham arrecadado R$ 640 milhões em 2005. Ele acredita que R$ 100 milhões seriam suficientes para manter as rodovias que hoje estão sob concessão.
Para tentar reverter os valores das tarifas, existem 92 ações correndo na Justiça. O diretor do DER disse ainda que a redução determinada em 1998 serviu de pretexto para a retirada de obrigações das empresas, como a duplicação de trechos e a construção de contornos.
Quanto à localização das praças, criticada por caminhoneiros, ele ressaltou que foi determinada em contrato e aceita pelo governo anterior.

Socorro

Na Rodovia BR-277, entre Curitiba e Guarapuava, um grupo de caminhoneiros de Toledo teve de esperar horas pelo atendimento da Caminhos do Paraná. Após um problema na turbina de um dos veículos, os motoristas pararam num recanto da Serra da Esperança, perto da praça de Irati. Contudo, o primeiro atendimento ocorreu apenas uma hora e cinco minutos depois que o caminhoneiro Anderson Luís Dalcin, 27 anos, acionou a empresa. Quando o guincho chegou, quase três horas depois do primeiro contato, outro problema. O engate não era compatível com o modelo do caminhão, um Internacional 9.800. O resultado disso foi um atraso de pelo menos 24 horas na entrega da carga de adubo que estava sendo levada de Ponta Grossa a Umuarama. ??O pedágio é bom, mas a tarifa tinha de baixar uns 30%??, diz Dalcin. Já na BR-376, em Ortigueira, o vendedor Valcir José Fontana, 37, teve atendimento rápido da Rodonorte. Após perder o controle numa curva, a Fiorino dele caiu no barranco. O motorista não se feriu.Com apoio da Polícia Rodoviária, o guincho da companhia foi rapidamente acionado para fazer a retirada da caminhonete.
Valores altos podem alterar destinos – Quase oito anos e vários aumentos depois, a instituição do pedágio nas estradas paranaenses ainda gera indignação e revolta entre os usuários. Mais do que a cobrança da tarifa em si, questionam-se os altos valores praticados pelas concessionárias.
O principal problema é que a implantação das praças de pedágio proporciona impacto difícil de calcular para quem tira o sustento das rodovias ou para quem vive próximo dos locais de cobrança.
Um caso exemplar é o do ex-caminhoneiro Romilton Edson Freghetto, de Cascavel, que com apenas 28 anos já deixou a profissão por não ter condições de bancar os custos das viagens. Morador de Cascavel, trabalhou como caminhoneiro por sete anos: dos 18 aos 25. ??Com a tarifa de pedágio muito alta e o óleo diesel muito caro, não estava mais sobrando o que sobrava antigamente??, constata. Viu-se, assim, obrigado a buscar alternativas para sobreviver. Hoje, faz o trabalho de intermediário entre cooperativas e caminhoneiros, para transporte de cargas.
Outro caso é o de Elisa Otília Werner, 60 anos, proprietária de comércio à beira da estrada BR-277, no trecho entre Curitiba e o litoral. Ela conta que viu o movimento cair drasticamente à medida que a tarifa do pedágio era reajustada. Hoje, até pensa em vender o estabelecimento, que é a fonte de sustento da família há quase uma década.
De acordo com Elisa, os clientes comentam que o que poderiam gastar no comércio é usado para pagar o pedágio. O resultado é uma queda de 50% nas vendas. No início, o movimento era grande. O pátio vivia lotado de carros. Num fim de semana, eram vendidos 300 cocos. Também eram servidas refeições e lanches. ??Agora, não me atrevo mais a fazer almoço. Pastel, só se alguém pedir, aí eu frito na hora??. Nos dias mais fracos, passa sem vender nada.
Elisa diz que ainda está confiante em conseguir vender o negócio. Cheia de energia, afirma que pretende ??cair na estrada?? para ganhar a vida, tentando sobreviver de artesanato. O sonho de um comércio próspero foi barrado na praça de pedágio.

Fonte: Folha de Londrina

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