Florianópolis, 1°.10.07 – O ano de 2008 tem tudo para ser o ano das ferrovias no Brasil. Em Santa Catarina, a discussão está adiantada e os novos traçados já têm data para entrar no papel. Até dezembro, o governo federal pega carona no grande investimento no setor portuário e lança o edital de licitação para o projeto da Litorânea Sul.
Cerca de R$ 1,2 bilhão estão sendo aplicados para o desenvolvimento e melhoria dos portos, desde Imbituba, passando por ItajaÃ, Navegantes e São Francisco do Sul, o que poderá mudar toda a estrutura de transporte no Estado. Também com o “pé direito”, a linha férrea Leste-Oeste entra em fase de estudos.
Para o superintendente do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (DNIT) em SC, João José dos Santos, 2008 será o momento de acertar o equilÃbrio da matriz de transporte.
– A prioridade federal era recuperar a malha rodoviária. Com a conclusão das obras, como a duplicação da BR-101, os projetos de grande magnitude para a estradas de ferro entram em discussão.
Santos costuma dizer que sem o transporte não há desenvolvimento e por esta razão, a malha ferroviária do Litoral pode ser a primeira a entrar no orçamento da União pela interligação dos portos.
O estudo de viabilidade está pronto há cinco anos. Enquanto o projeto não vai para o papel, 45 simulações de traçados já foram realizadas num convênio entre o Estado e o Ministério dos Transportes.
Para a Litorânea, o traçado considerado viável segue o entorno da BR-101, para unir a ferrovia Tereza Cristina, no Sul do Estado, ao restante da malha nacional, via operadora América Latina LogÃstica (ALL), a partir de Araquari, no trecho Mafra-São Francisco do Sul, o que resulta em 236 quilômetros a serem construÃdos. Hoje, a extensão da malha ferroviária catarinense é de 1.354 quilômetros.
Embora desatualizado, o valor, em 2001, para implantação da ferrovia foi avaliado em R$ 448 milhões, uma média de R$ 1,89 milhão por quilômetro.
Prioridade do transporte para segmento de cargas – Responsável pelo traçado tecnicamente viável, o engenheiro ferroviário Carlos Rodrigues Ribeiro destaca que a topografia do Litoral favorece a obra. Só três túneis podem entrar no projeto: Em Enseada do Brito, Palhoça, Biguaçu e Balneário Camboriú. Em alguns pontos, como na Grande Florianópolis, a ferrovia poderá ficar até seis quilômetros distantes do traçado da BR-101.
A velocidade média do trem, de acordo com o engenheiro ferroviário será de 60 km/h, enquanto que a velocidade média mundial para cargas, é de 32 km/h. – Os trilhos estão projetados para a velocidade das locomotivas de passageiros chegarem até 100 km/h – adianta.
O estudo inicial é para o transporte de cargas. Para o superintendente do DNIT, uma maneira de desafogar o trânsito e conservar as rodovias. Em 1999, 25 milhões de toneladas de cargas catarinenses foram transportadas pelo Litoral.
A estimativa é colocar o Brasil no padrão dos EUA nos transportes onde o setor ferroviário lidera com 43% e estradas ficam com 32%. No Brasil, respectivamente, este Ãndice é de 25% e 58%. Com os recursos garantidos, o tempo de execução da obra é de três anos. A elaboração do projeto pode levar até um ano.
O empresário Ildo Batistella, que realiza investimento em um terminal portuário privado em Itapoá, no Litoral Norte, defende que a prioridade deve ser a definição do traçado para a ferrovia Litorânea, pois a situação das rodovias está crÃtica pelo grande volume de caminhões que trafegam nas BR-101 e 470.
– Para manter a estrutura da ferrovia é preciso recursos e quanto mais alongar a possibilidade de estender o trecho, maior o volume de cargas a malha vai receber. É fundamental uma ligação com as linhas argentinas para que possamos exportar para os paÃses vizinhos via trem – disse.
O Estado lançou, há cerca de 10 dias, um fórum para avaliar a viabilidade ferroviária de novas linhas no Estado. O grupo conta com técnicos e empresários.
Obras do PAC
Projetos incluÃdos no Programa de Aceleração do Crescimento federal
– Construção de contorno ferroviário Joinville
Execução – 18 quilômetros de extensão
Conclusão prevista – 2009
Investimento – R$ 52,7 milhões
Situação espera assinatura do contrato
– Construção de contorno ferroviário São Francisco do Sul
Execução – 8,4 quilômetros de extensão
Conclusão prevista – 2008
Investimento – R$ 24,1 milhões
Situação Iniciada há 30 dias
Cenário nacional do setor de transportes
Rodoviário – 58%
Ferroviário – 25%
Aquaviário – 13%
Dutoviário e aéreo – 4%.
Divergência para definir prioridades
Quando o assunto é identificar a ferrovia mais importante para o momento, as opiniões divergem entre técnicos e empresários. Alguns chegam a demostrar interesse na mudança dos traçados.
O engenheiro Carlos Rodrigues Ribeiro considera que a ferrovia do Litoral é a mais importante para o Estado no momento, pela interligação dos portos. Seu anteprojeto contempla três pontos de terminais intermodais para receber as cargas das rodovias nas proximidades dos principais portos catarinenses.
Já o professor de Gestão de Operações e LogÃstica da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Moacir Fogaça, acredita que a implantação da ferrovia Leste-Oeste, no presente momento, seria mais interessante que a Litorânea, tendo em vista a duplicação da BR-101 em fase de conclusão que irá atender a interligação portuária no Estado.
Para ele, a utilização de forma planejada e coerente dos novos recursos de escoamento de produção em Santa Catarina trará vantagens competitivas para Estado e para o paÃs, pois haverá redução nos custos logÃsticos e a possibilidade de interligação marÃtima, rodoviária, ferroviária e aérea.
– A importância destas novas estruturas se dá por sua integração. A utilização inteligente do sistema logÃstico implica em aumento da competitividade dos produtos catarinenses no mercado – avalia.
Grupo Votorantim propõe alterações – O presidente do Grupo Batistella, Ildo Batistella, observa que não existe em qualquer parte do mundo ferrovia que sobreviva apenas do transporte de manufaturados. Por esta razão, ele defende que, em caso de implantação, é preciso avançar até no Norte da Argentina, possibilitando o escoamento de grãos e minérios oriundos de outros paÃses até os portos catarinenses.
– Na contramão, o trem levaria os produtos que Santa Catarina exporta para as provÃncias daquelas regiões – destaca Batistella.
A Votorantim Cimentos propõe até alterações no traçado da ferrovia Leste/Oeste para escoar a sua produção de cimento da fábrica de Vidal Ramos, que começa a ser construÃda no próximo ano. A proposta é defendida pelo diretor de LogÃstica da empresa, Fred Fernandes.
Com a produção prevista de 1,3 milhão de toneladas por ano na fábrica de Vidal Ramos, a Votorantim, segundo Fernandes, tem condições de se tornar a principal cliente da nova malha ferroviária.
– Com certeza, a redução do custo do frete vai favorecer o consumidor e aumentar a competitividade das empresas catarinenses.
“Oportunidades são imensas”
Entrevista: Celso Schurhoff, gerente de planejamento da Ferrovia Tereza Cristina
Diário Catarinense – SC está investindo na ampliação dos principais portos do Estado. Há intenção de ampliar esta participação a partir da criação da Translitorânea?
Celso Schurhoff – Atualmente, a FTC possui acesso somente ao Porto de Imbituba, devido à s limitações e caracterÃsticas operacionais da ferrovia – curta distância e especialização da atividade para minério. Ao longo das últimas décadas, operou transportando como carga principal o carvão mineral, mas estamos atentos à s novas perspectivas.
DC – Quais as oportunidades de negócios que estão surgindo no Estado?
Schurhoff – Embora seja grande o interesse de expandir os negócios, transportando outras cargas, as iniciativas, à s vezes, acabam frustradas pela limitação da malha ferroviária, que não chega a outros pontos de destino das cargas. Com a expansão da ferrovia, conectada com os portos catarinenses e também a malha ferroviária nacional, em São Francisco do Sul, as oportunidades e possibilidades de transporte passam a ser imensas.
DC – Quais os setores produtivos que hoje são considerados estratégicos para os negócios da FCC no Estado?
Schurhoff – Os setores estratégicos da ferrovia são aqueles que mais diretamente representem potencial de cargas ferroviárias. Podem ser citados os setores de extração mineral, a indústria cerâmica, a carga conteinerizada e os produtos para o agronegócio.
“Gostaria de mais velocidade”
Entrevista: Bernardo Hess, presidente da América Latina LogÃstica (all)
DC – Sendo a ferrovia um modal estratégico num paÃs do tamanho do Brasil, o que está faltando para que cresça?
Hess – A gente está passando por um boom ferroviário, mas é totalmente privado. O governo tem dado apoio. A iniciativa privada recuperou a malha, não existe mais vagão nem locomotiva sobrando. Nós, por exemplo, estamos adicionando em torno de 1,5 mil vagões e 50 locomotivas por ano, aumentando a capacidade de transporte entre 10% e 15% em volume anualmente.
DC – O que está faltando para o PAC deslanchar no Brasil?
Hess – Acho que o PAC é muito positivo, porque dá uma lista de prioridades muito clara. Vejo com muito bons olhos isso. Acho que o BNDES está muito atento, o governo está nos procurando, estou muito animado de que alguma coisa possa sair. As coisas estão acontecendo, mas gostaria de mais velocidade no andamento dos projetos.
DC – Santa Catarina está investindo na modernização dos principais portos. A ALL está atenta à s perspectivas de negócios?
Hess – Sim. Este é um projeto importante e estratégico, que daria um salto na logÃstica do Estado, fazendo com que a ferrovia acesse todos os portos de escoamento catarinenses.
DC – Quais os setores produtivos catarinenses que hoje são considerados estratégicos para a ALL no Estado?
Hess – Todos os segmentos de contêineres, frigorificados e grãos, além de papel e celulose.
Fonte: Diário Catarinense