SC: Liderança trágica

Brasília, 26.4.07 – Levantamento divulgado ontem pelo Ministério da Saúde aponta Santa Catarina na liderança de um ranking nacional. Infelizmente, um trágico ranking: é o Estado do país com maior índice de mortes no trânsito. Estatísticas referentes ao ano de 2005 mostram que as estradas e ruas catarinenses matam, em média, 32,2 pessoas a cada 100 mil habitantes.
Em Brusque, no Vale do Itajaí, o índice é ainda maior. O município, de acordo com dados do Ministério da Saúde, é o segundo mais perigoso do país para motoristas e pedestres – ou, proporcionalmente, o com maior número de mortes em relação à população.
Na cidade, de acordo com o ministério, foram registrados 46 óbitos para cada 100 mil habitantes em 2005. O município perde apenas para Tailândia, no Pará, onde a média registrada foi de 83,98 óbitos.
A pesquisa do Ministério da Saúde revela ainda outros dados preocupantes para o Estado. No ranking dos 50 municípios com os maiores índices de mortalidade, que leva em consideração cidades entre 20 mil e 100 mil habitantes, estão 11 municípios catarinenses. Neste levantamento, que é resultado da média dos acidentes ocorridos entre 2002 e 2004, Guaramirim amarga a segunda colocação. A taxa de mortalidade no município, considerando os três anos, é de 204 óbitos para cada 100 mil habitantes.
Em um terceiro estudo, que computou dados de municípios com mais de 100 mil habitantes, aparecem Itajaí, Jaraguá do Sul, Palhoça, Criciúma, Chapecó e São José. Ocupando a 4ª colocação no país, Itajaí registrou 115,2 óbitos para cada 100 mil habitantes. O número de mortes na cidade é relacionado a 178 acidentes que ocorreram de 2002 a 2004.

Morte de jovens é considerada alarmante

Outro dado alarmante da pesquisa é o alto número de mortes entre jovens. Somente em 2005, a cada 100 mil catarinenses morreram 32,9 jovens com idade entre 10 e 19 anos.
A taxa, uma das maiores do Brasil, é atribuída ao consumo de bebidas alcoólicas e ao uso de drogas. A alta velocidade, assim como o não uso de capacete ou de cinto de segurança, aliados a problemas de infra-estrutura em rodovias e vias públicas, completam a lista de causas das estatísticas.
– É necessária uma estratégia de comunicação diferente para os mais jovens, que hoje usam drogas, bebem, dirigem em alta velocidade e, infelizmente, morrem cotidianamente – alertou o ministro da Saúde, José Gomes Temporão.
O levantamento nacional foi feito a partir do número de certidões de óbito vinculadas a acidentes de trânsito. Embora alguns estados mantenham um controle precário das ocorrências, o estudo apresenta um retrato fiel de Santa Catarina, segundo o Ministério da Saúde.

Falta fiscalização e sobra impunidade

A dificuldade de fiscalizar as normas estabelecidas pelo Código de Trânsito Brasileiro, a impunidade e a impudência de motoristas. Esses são alguns motivos que, na avaliação de especialistas, explicam a liderança de Santa Catarina no ranking de mortes no trânsito.
Para a coordenadora da Secretaria de Vigilância e Saúde do Ministério da Saúde, Deborah Malta, a principal causa é a falta de fiscalização nas ruas e estradas catarinenses.
– Algumas cidades, especialmente as menores, enfrentam problemas para cumprir o Código de Trânsito Brasileiro – explicou Deborah.
Nas BRs, o maior obstáculo para a efetiva vigilância dos motoristas seria a falta de efetivo na corporação, aponta o inspetor Luiz Graziano, da Polícia Rodoviária Federal.
– Hoje são 550 agentes. Precisaríamos de, no mínimo, o dobro de pessoas – afirmou.
Faltam também equipamentos mais adequados de fiscalização, como radares fotográficos. Mas o aspecto que ele considera determinante para o alto número de acidentes e óbitos é a falta de punição dos infratores, geralmente causada por entraves operacionais, como a ausência de um sistema que permita o envio de multas a estrangeiros.

Punições previstas não são cumpridas

– As pessoas, principalmente os jovens, não acreditam no sistema. Há uma grande impunidade, e o jovem está sendo mal educado – explicou.
A Polícia Militar Rodoviária enfrenta outro tipo de dificuldade na fiscalização das SCs. Segundo o major José de Souza Filho, comandante interino da Polícia Militar Rodoviária, a proibição da utilização de radares fixos, em 2002, gerou um aumento no número de acidentes e mortes. Com a compra de 13 radares móveis em agosto do ano passado, a polícia já observa uma redução na quantidade de acidentes. Entre agosto de 2005 e abril de 2006, foram registrados 263 mortes em rodovias estaduais. No mesmo período, entre 2006 e 2007, o número caiu para 224.
– Santa Catarina é o único Estado que não tem um controle de velocidade com radares fixos em rodovias estaduais – reclamou.
A impunidade também é apontada pelo Detran como um dos principais motivos do alto número de acidentes. Segundo o psicólogo Jacinto Antônio Pereira, da Gerência de Campanhas Educativas, existem casos em que o código de trânsito prevê punições, mas não é possível viabilizá-las. É o caso da suspensão da carteira quando o motorista atinge 20 pontos. Até hoje, o Detran não cumpre a lei porque não possui um programa de informática adequado.
– Desde a implantação do código, está tudo truncado. O Detran carece de estrutura – comentou.
Com isso, os motoristas têm a sensação de impunidade e passam a ser mais imprudentes ao dirigir. Esta também é a opinião do superintendente do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) no Estado, João José dos Santos. Para ele, 95% dos acidentes ainda são provocados pela imprudência dos motoristas.
– O trecho norte tem mais acidentes que o trecho sul da BR-101. Quanto mais se melhora (as rodovias), mais as pessoas abusam da velocidade – lamentou.
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, alertou que o carro pode ser uma arma, e que as pessoas precisam ter consciência. Para ele, os acidentes e mortes no trânsito entre jovens, por exemplo, só podem ser reduzidos com leis mais rígidas para a venda de bebidas alcoólicas e alterações no enfoque das campanhas de conscientização.
– Atualmente, bebidas alcoólicas são vendidas em estradas, em postos de gasolina. Temos que apertar a fiscalização em relação aos jovens que bebem e depois dirigem. Nós temos que rever a veiculação de propagandas de bebidas hoje, que é um forte fator de estímulo ao consumo irresponsável. Temos que ter medidas educacionais mais sérias. Temos que ter a escola de maneira integrada com a família e nós temos que ter uma abordagem que não é só do governo, precisa da participação da sociedade, das entidades, privadas, organizações não governamentais, pais e famílias – defendeu.
No evento de divulgação do relatório, o ministro das Cidades, Márcio Fortes, se emocionou ao lembrar a morte do filho em um acidente de trânsito. E defendeu como essencial que medidas conjuntas sejam tomadas. É um conjunto de medidas. Tem que ter legislação adequada para exigir do motorista uma ação, tem que ter pistas adequadas, ou seja, não esburacadas, bem, sinalizadas, e você tem que ter veículos em condições de trafegar, afirmou.
Para conscientizar motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres que as mortes podem ser reduzidas, o Ministério da Saúde vai distribuir em todo o país folhetos com o tema A vida no trânsito: Sua atitude faz a diferença.

Os acidentes
No Brasil
2002 : 32.753
2005 : 35.753
Diferença : +9%
Sétima maior causa de mortes no Brasil
Municípios com menos de 100 mil habitantes
1990 : 9.998
2005 : 17.191
Diferença : + 72%
Nos grandes municípios, o número de óbitos subiu 5%.
Faixas etárias mais afetadas
20 aos 39 : 45%
40 aos 59 : 26%
Total ; 25.375 (85% homens)
Jovens e adolescentes
> Trânsito é a 2ª principal causa de morte no Brasil (perde apenas para homicídios)
> Em 2005, 3.976 pessoas entre 10 e 19 anos morreram
> Santa Catarina lidera o ranking de mortalidade de jovens em acidentes de trânsito no Brasil. São 32,9 óbitos para cada 100 mil habitantes no Estado. Esses jovens têm entre dez e 19 anos.
Veículos
> O risco de morte de jovens entre 15 e 24 anos em acidentes com motocicletas é maior do que para os outros meios de transporte.
> Em 2005, 2.284 motociclistas morreram, número que representou quase duas vezes o risco de morrer atropelado.
Internações no SUS
Em 2006 : 123.061 pessoas
Custo : R$ 118 milhões
Maiores causas
Atropelamentos : 41.517
Acidentes com motos : 34.767
Principais motivos
> Consumo excessivo de bebidas alcoólicas
> Alta velocidade
> Não uso de capacetes ou de cinto de segurança
> Problemas na infra-estrutura de rodovias e vias públicas
Impacto socioeconômico
Estimado em R$ 24,6 bilhões
Relacionados à
> Perda de produção em razão da morte das pessoas
> Interrupção das atividades das vítimas
> Custos com os cuidados em saúde
> Gastos associados aos veículos
> Além dos custos diretos, há vários outros, como a desestruturação familiar e pessoal.
Fonte: Diário Catarinense

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