Florianópolis, 12.6.06 – A exposição de corpos à s margens das rodovias catarinenses denuncia um mercado de exploração sexual em expansão. Mulheres se prostituem por poucos trocados e contribuem para o ciclo de criminalidade como o tráfico de drogas, pequenos furtos e a exploração sexual infantil.
Muitas vezes mascaradas pela simples intenção de pedir uma carona, mulheres se colocam em posições estratégicas em alguns dos pontos mais movimentados das estradas. Na BR-101, na Grande Florianópolis, o DC, em dois dias, identificou 12 pontos de prostituição em menos de 15 quilômetros.
O policial rodoviário Adriano Fiamoncini confirmou que o movimento da rodovia estipula os trechos onde há o maior Ãndice de “caroneiras”.
Como ficar à margem da rodovia pedindo carona não é crime, elas aproveitam a legislação que prevê a punição apenas para a exploração sexual e prostituição infantil.
Não podemos evitar que os veÃculos parem e ofereçam carona para essas mulheres, mas multamos qualquer um que deixe o veÃculo estacionado à margem da rodovia.
Diante desta prerrogativa, a ex-enfermeira particular Maristela*, de 35 anos, ergue o polegar todas as manhãs nas proximidades dos motéis de São José. Não há um horário especÃfico, mas a oferta sempre acontece perto do meio-dia como se fossem mercadorias expostas para o almoço. O mesmo acontece nos perÃodos da tarde e noite.
A exemplo dos bois, cada parte do corpo destas mulheres tem um preço que pode variar de R$ 10 a R$ 50. Cansada de passar madrugadas em claro cuidando de pessoas enfermas por pouco mais de dois salários mÃnimos, ela comemora o atual rendimento que chega a ser três vezes maior.
– Nunca tive problemas de violência e somos sempre bem tratadas, mas para evitar qualquer surpresa eu só trabalho durante o dia. O importante é conseguir dinheiro para cuidar dos meus dois filhos – afirmou.
A gaúcha que vive na região há 19 anos, trabalha desde 2001 na marginal da BR-101. Ela revela que foi “aliciada” por uma amiga e, por isso, teve facilidade de entrar no mercado do sexo.
* nome fictÃcio em respeito ao Código de Ética da RBS
Programa com adolescente de 16 anos pode custar R$ 20
Numa abordagem a uma garota que pede carona na marginal da BR-282 (Via Expressa), em São José, a jovem, que diz ter 19 anos, oferece uma amiga adolescente por R$ 20. Segundo o núcleo de comunicação da PolÃcia Rodoviária Federal (PRF), cinco adolescentes foram apreendidas por prostituição em todo o Estado, em 2005, nos 2.304 quilômetros de estradas.
A “agenciadora” dá todos os detalhes e oferece possibilidades variadas
– Se você não quer ficar comigo eu tenho uma amiga de 16 anos. Eu trago ela aqui por R$ 20, e você pergunta para ela quanto ela cobra – disse a jovem em trajes mÃnimos.
Apesar de ter decorado uma data de nascimento, a jovem aliciadora também parece ser uma adolescente. Ao ser questionada sobre um documento de identidade, ela repetiu a data de nascimento e afirmou que era só fazer as contas. No caminho até a adolescente, ela percebeu que estava sendo fotografada e correu no sentido oposto.
O vendedor Paulo Ricardo, de 50 anos, vive com a esposa e duas filhas a menos de cem metros de um ponto de prostituição na marginal da Via Expressa. Ele confirma que o movimento ocorre nos horários mais inusitados e sempre vê adolescentes entre as mais velhas.
A famÃlia não tem tranqüilidade em deixar as crianças brincando sozinhas no quintal de casa pelo movimento das garotas que é seguido pelo tráfico de drogas. O vendedor explicou que algumas jovens estão acompanhadas de gigolôs. Eles dão uma sensação de segurança para as garotas e esperam o dinheiro do programa. A quantia arrecada é utilizada para a compra de drogas como cocaÃna, maconha e crack.
De carros populares a modelos importados
– A qualquer hora do dia você passa e sempre tem uma menina na esquina à espera de um cliente. Elas chegam a levantar a saia para mostrar o corpo e tudo acontece a dois quarteirões do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) – lamentou.
Um comerciante, de 44 anos, que prefere não se identificar, também sofre com a prostituição. Ele disse que os clientes são os mais variados e se utilizam de carros populares até modelos importados. Além disso, as garotas brigam entre elas pelo ponto.
– Só em eu falar com você eu já posso ter um problema, mas a região está insuportável e alguém precisa tomar uma providência. Quando elas não estão brigando com os clientes, são entre elas e as pedras voam para todos os lados – completa.
Diálogo com agenciadora
Diário Catarinense – Você faz programa?
Garota de programa – Depende de quanto você quer me pagar…
DC – Mas quantos anos você tem?
GP – Eu tenho 19.
DC – Quantos?
GP – 19. Eu faço 20 anos no dia 24 de junho e nasci em 1986. Mas se você não quer ficar comigo eu tenho uma amiga de 16.
DC – Ela mora com os pais?
GP – Porque, você quer uma estudante?
DC – Não, só queria saber se ela tem famÃlia.
GP – Deve ter, mas eu não sei. Por R$ 20 eu trago ela até aqui.
DC – R$ 20 custa o programa com ela?
GP – Não, R$ 20 é para eu trazê-la aqui. O programa você acerta com ela.
DC – Quanto tempo leva para ela chegar até aqui?
GP – Ela está bem perto.
DC – Obrigado, vou pegar o meu carro e volto mais tarde.
Rede de informações prejudica fiscalização
O policial rodoviário Adriano Fiamoncini afirma que a rede de informações dos donos de casa noturnas dificulta a realização das fiscalizações em Santa Catarina.
A única operação realizada neste ano não conseguiu apreender nenhuma adolescente.
– Quando realizamos uma operação baseada nos levantamentos do núcleo de inteligência, temos que chegar numa casa onde há mais evidências de obter êxito. Isso acontece porque o proprietário ou o funcionário da primeira casa fiscalizada entra em contato com as outras avisando sobre a fiscalização – explica o policial do núcleo de comunicação social.
Operações registram trabalho escravo
As operações nas casas noturnas e postos de combustÃveis à s margens das rodovias catarinenses são feitas em conjunto com a PolÃcia Civil e com a Vigilância Sanitária. A PolÃcia Rodoviária Federal (PRF) tem o mapeamento das localidades onde costumam trabalhar com menores de idade.
Algumas mulheres são submetidas a uma espécie de trabalho escravo, onde elas têm de dormir e comer nestes estabelecimentos e deixam quase todo o dinheiro com os aliciadores.
O crime de aliciar menores é previsto pelo código penal com pena de um a três anos de reclusão. A pena pode ser aumentada se o aliciador for um familiar ou se houver violência.
– Se chegarmos numa casa e uma jovem estiver com um adulto, este homem e o proprietário do estabelecimento são presos em flagrante. A maior dificuldade é encontrar adolescentes insatisfeitas que denunciem os maus-tratos – disse.
A PolÃcia Rodoviária Federal deve realizar novas fiscalizações em breve. O procedimento é realizado durante o perÃodo noturno onde há uma maior incidência.
Fonte: Diário Catarinense