Desafios para SC crescer

Florianópolis, 28.3.08 – Sem investimentos consistentes em infra-estrutura durante décadas, o país entrou no século 21 com uma série de problemas, agravados pelo novo cenário de crescimento econômico. Racionamento de energia, caos nos portos, situação precária das rodovias federais e crise aérea ameaçaram a logística do país e do Estado.
Na tentativa de reverter um apagão generalizado, muitos projetos de modernização e recuperação foram postos em prática, alguns contemplados pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, que colocam Santa Catarina numa posição de destaque no cenário nacional.
Para mostrar os desafios do país e do Estado, o Diário Catarinense publica, neste domingo, um caderno especial sobre infra-estrutura, material que mapeou o Estado, apontando todas as obras em construção, os projetos previstos e a estrutura atual de geração de energia elétrica, energia combustível e transportes nos vários modais: rodoviário, ferroviário, portos e aeroportos.
Com a avaliação de especialistas, comparação com novos modelos, apresentação de oportunidades, além das justificativas dos órgãos competentes sobre a situação de cada setor, o caderno Os Desafios para a Infra-Estrutura Catarinense, encartado na edição de domingo, pretende alertar para a necessidade de investimentos contínuos a fim de que a economia siga por um curso virtuoso de crescimento. O material complementa uma série de cadernos publicados anualmente pelo DC desde 2005, sempre com o objetivo de monitorar avanços e gargalos da infra-estrutura catarinense.

Risco de racionamento no setor energético

Especialistas do setor energético apontam que há riscos de novo racionamento de energia até 2010 porque o Brasil depende dos recursos hídricos e da chuva para gerar energia elétrica. O Ministério das Minas e Energia (MME) e o Operador Nacional do Sistema (ONS) negam, mas admitem que é preciso rezar para São Pedro por chuvas para garantir o abastecimento do país.
No Estado, a chuva tão desejada para encher reservatórios de usinas hidrelétricas causa estragos irreversíveis, também por falta de infra-estrutura, entre eles quedas de barreira, alagamentos e congestionamentos gigantescos nas precárias rodovias.
– Desta vez não vai acontecer como em 2001, quando a região Sul ficou de fora do racionamento porque não havia linhas de transmissão com potência suficiente para levar a energia para o Sudeste. Foram feitos investimentos no sistema de transmissão – alerta o diretor da Eletrosul, Antonio Waldir Vituri.
A energia combustível também preocupa Santa Catarina, que depende exclusivamente do gás natural importado da Bolívia. Mas a SCGás, distribuidora do gás no Estado, apresenta vários projetos para reduzir a dependência do insumo boliviano.
Os portos catarinenses, elogiados pela Secretaria Especial dos Portos (SEP), receberam investimentos e estão se modernizando. Mas a formação de um complexo portuário em Santa Catarina, que credencia o Estado para elevar a movimentação nos cinco terminais existentes (um ainda em construção), também pode resultar em gargalos de infra-estrutura.
– Podemos estar criando um monstro. Se não houver investimento maciço nas rodovias e nos acessos aos portos, teremos um gargalo ainda maior – alerta o coordenador geral de Logística da SEP, João Aparício dos Reis Costa.
De fato, as rodovias federais que cortam o Estado precisam de muitos investimentos. Porém, os R$ 868 milhões que o Ministério dos Transportes promete injetar via PAC em 2008, R$ 583 milhões, quase 70%, serão aplicados na duplicação da BR-101 Sul. O cronograma das obras está atrasado. O superintendente do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (Dnit), João dos Santos, reconhece que, por causa das chuvas, entre 70% e 80% estará concluído até dezembro.
– Quando terminar a duplicação, já estaremos precisando de uma terceira pista – projeta o presidente da Federação das Empresas de Transportes de Cargas de SC (Fetrancesc), Pedro Lopes.

Precariedade das rodovias tem alto custo

Numa viagem de 4.097 quilômetros dentro do Estado, a equipe de reportagem do Diário Catarinense, que percorreu todas as rodovias federais que cortam o território de SC para produção do caderno Os Desafios para Infra-Estrutura Catarinense, assistiu a dezenas de acidentes e quase sofreu alguns.
Carros capotados, caminhões virados ou quebrados, cargas espalhadas nas estradas, colisões, atropelamentos. Situações provocadas pela falta de sinalização, precariedade da pavimentação asfáltica e projetos de engenharia ultrapassados.
Na BR-282, quase no trevo de acesso a Chapecó, no Oeste, o motorista Eli José Pires lamentava a carga de farinha perdida na estrada. A carreta do Scania resvalou em buracos do acostamento e não se sustentou.
– Ainda bem que temos seguro para a carga, mas o prejuízo do caminhão é só meu – contou Pires.
Em Dionísio Cerqueira, no Extremo-Oeste, pela BR-163, mais uma surpresa do que a falta de infra-estrutura é capaz de provocar. Já sem ocupantes, um Gol branco, de Sapiranga (RS), jazia de capotado no acostamento da estrada. Felizmente, sem sinais de vítimas fatais.
Na BR-470, próximo ao trevo de Timbó e Indaial, no Vale do Itajaí, uma colisão provocava longos congestionamentos e atrasos.
Na BR-116, Km 175, o motorista de um caminhão de Navegantes José Eugênio Vieira, ao desviar de buracos na estrada, perdeu a direção e quebrou o eixo do veículo no desnível do acostamento e tombou. Carregando farinha de trigo para Caçador, o motorista estava desolado.

Na BR-280, o susto poderia ter sido maior

– Falta sinalização, os buracos são imensos e quando a gente pensa que vai se salvar no acostamento o desnível é tamanho que quebra o caminhão todo – afirmou.
Na BR-280, em São Bento do Sul, Norte do Estado, descendo a serra para Corupá, o susto poderia ter sido maior. Numa curva, cavalo e carreta desconectados e um caminhoneiro atônito. Nelson Basso estava preocupado com o que poderia ter ocorrido, mas por sorte nenhum outro veículo passava pelo local no exato momento em que a quinta roda (que liga a carreta ao cavalo) quebrou.
– Tenho 40 anos na estrada, isso nunca tinha acontecido. O problema é que a gente trafega por rodovias tão ruins que não há manutenção que chegue – lamentou.
Pedalando pela BR-116 rumo ao trabalho, Ilvio da Luz Rosa quase foi atropelado numa curva. Ele escapou por um triz desviando a bicicleta no município de Ponte Alta do Norte, no Meio-Oeste. Mas não se livrou de um pneu furado ocasionado pela falta de acostamento, após sair da estrada para evitar a morte.

BRDE investe em energia e logística

O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) tem atuado como um dos principais financiadores de infra-estrutura em SC, em especial nos setores de energia e de logística. Dentro da carteira do banco destinada ao setor, de R$ 475,5 milhões, 42% correspondem aos investimentos no Estado, somando um valor de aproximadamente R$ 200 milhões.
A tendência, segundo o presidente Renato Vianna e o diretor-financeiro Casildo Maldaner, é que o número de operações cresça em 2008 pela alta demanda. Aquelas relacionadas ao setor energético na área de atuação do BRDE (Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul) equivalem a 8,7% de toda a carteira do banco, estimada em R$ 3,7 bilhões.
Uma área de destaque é a de construção de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em virtude do potencial hídrico do Estado. O caso mais recente foi a da PCH Alto Benedito Novo I, com capacidade de geração de 15 megawatts (MW). Do investimento total de R$ 15 milhões, R$ 10 milhões foram financiados pelo banco, destinados a obras civis, máquinas e equipamentos e rede de transmissão, entre outros.
Para investimentos em energias renováveis, o BRDE apoiou, com R$ 9 milhões, a implantação de um parque eólico no município de Água Doce, na divisa entre SC e PR. O financiamento correspondeu a 70% dos investimentos totais, R$ 29,2 milhões, feitos pela Cenaeel. O parque possui 9 MW de capacidade nominal, fornecida por 15 aerogeradores de 600 quilowatts (kW) e 500 metros de linha de transmissão.
– O projeto mostra nossa contribuição à diversificação da matriz energética brasileira: uma fonte renovável e não poluente – diz Vianna.
Embora de forma mais pulverizada, a área de logística também tem sido bastante contemplada pelo BRDE.
– Os valores são mais baixos, mas o número de operações é grande e distribuído por todas as regiões – observa Maldaner.
O setor envolve as atividades de armazenamento, transporte, terminais portuários, portos secos e retroáreas.

SIMONE KAFRUNI

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